UNIDADE COM A NATUREZA
O homem não é um animal que deixou de ser o que era,
mas a evolução o promoveu à condição de animal racional. A racionalidade não
enfraquece nem dispensa a sua animalidade. O que a evolução pretende não é um
animal menos animal, mas, ao contrário, uma espécie biológica de ordem
superior!
Quando o homem esquece que é primo e parente próximo
dos demais representantes da biosfera, começa a trocar as mãos pelos pés.
Muito de fundamental podemos aprender estudando o
modo como animais organizam seu modo de viver em família.
O homem não pode isolar-se da natureza. Precisa dela
e ela tem necessidade da presença do homem. Entre a consciência do homem e o
instinto do animal ou da planta existe uma convergência de natureza simbiótica.
A vida é um todo holístico que, no entanto, se manifesta através de milhões de
formas diferentes!
A natureza é um todo ecológico do qual o homem faz
parte. Esquecer esta verdade fundamental é o mesmo que condenar-se à extinção.
Mas é isto que estamos fazendo com as “bênçãos” e as verbas do governo
americano. Somos filhos da natureza e filhos da Mãe Terra, e deveríamos
orgulhar-nos disso!
Tudo em nossas cabeças passa a desandar a partir do
momento em que perdemos a consciência de que cada coisa só existe na medida em
que está se relacionando com outras. A palavra consciência cósmica é usada para
expressar esta verdade.
Padre Marcos Bach
É PRECISO APROVEITAR BEM O PRESENTE
O passado pouco tem a nos ensinar. Mas o presente,
quem sabe, nos pode oferecer insights
mais aproveitáveis. Podemos encarar o presente como sendo o último degrau de
uma civilização. Temos razões de sobra para isso, pois os sintomas de
decadência sociocultural são evidentes. Visíveis a olho nu.
O pessimista realça a visão dos aspectos negativos do
ambiente social, esquecendo o seu lado positivo. O tradicionalista vive da
saudade dos tempos que se foram e não voltam mais. O religioso fanático e
saudosista prega o retorno a uma religiosidade mais combativa e arcaica do que
a que se deveria esperar de membros de uma sociedade verdadeiramente evoluída e
moderna. A época dos mártires passou e seu lugar está sendo ocupado por uma
legião de falsos mártires. Mártir é aquele que morre por sua fé. Aquele que
morre matando é um reles assassino. Cruzados não são mártires. Não foi Cristo
que inventou a guerra santa.
O presente é na realidade o único espaço de tempo
verdadeiramente aproveitável. “Carpe diem”, dizia o poeta romano. Devemos aprender a arte de “curtir”
cada dia como se fosse o primeiro e o último da nossa vida, dizemos hoje. “Não
vos preocupeis com o dia de amanhã” (Mt 6,34). Pois o dia de hoje já nos
proporciona uma sobrecarga de cuidados e preocupações. Ao menos hoje é assim
para a maioria das pessoas.
Viver intensamente a vida significa hoje, mais do que
nunca, viver cada momento presente. Nesta questão podemos tomar um monge
contemplativo, budista ou cristão, como mestre e modelo de vida. Pois é dentro
de nós que acontecem as coisas verdadeiramente importantes e decisivas da
história humana.
A História, a que merece este nome, não se escreve
com tinta. Menos ainda com rajadas de metralhadora, como dizia Mao Tsé-Tung.
Não se escreve apenas com sangue, suor e lágrimas como pensava Winston
Churchil. Só há uma única maneira de fazer e de escrever História: é o amor com
que a humanidade souber amar! A humanidade toda, sem distinção. Enquanto
restringirmos o amor, impondo-o como obrigação moral e profissional, o
Amor-Amor continuará a ser a gata borralheira que sempre foi.
No dia em que Jesus voltar a morar no meio de nós
encontrará pela frente dois pontos de estrangulamento sociocultural: dum lado
irá defrontar-se com toda a monumental massa de problemas gerados pela
incapacidade dos homens de se amarem uns aos outros; do outro lado estarão os
poucos com que poderá contar. São os que já descobriram que o futuro e a
sobrevivência da humanidade é, sobretudo, uma questão de amor e que a simples
justiça não basta para operar o milagre da reconciliação da humanidade com seu
Criador, consigo mesma e com a Mãe Natureza.
Amar significa colocar o próximo dentro de si mesmo,
tratando-o como aliado natural, em vez de mantê-lo fora e até longe de si. A
simples aproximação e boa vizinhança não é suficiente. É necessário fazer do
amor um processo de identificação psicológica. Eu sou o outro e o outro sou eu
mesmo. Antes de ser indivíduo, sou pessoa.
A individuação constitui apenas um momento dentro do
processo evolutivo. Consiste em tomar consciência do direito que cada ser
humano tem de ser diferente e até certo ponto representante único da sua
espécie.
A personalização se dá em sentido oposto. Consiste
basicamente na tomada de consciência de que o universo é um tecido, uma teia,
uma toalha (como o define Teilhard de Chardin): nele tudo se encontra interligado
a ponto de constituir um Todo, um Hólos,
um TAO.
Cada “parte” é este Todo e só pode ser entendida
quando considerada como tal. Tarefa da mente humana é revelar a presença ativa
de um Todo maior em cada parte. Temos que substituir nosso conceito de natureza
por outro. Charles Darwin está superado. A Biosfera já teria desaparecido há
milhões de anos não fosse o apoio solidário que cada membro seu presta aos
demais.
O Criador organizou a natureza fazendo dela uma
espécie de “casa comum de todos os viventes”. A palavra Ecologia vem de oikos, que em grego significa casa. O
que fizeram do nosso planeta os “amigos” do progresso? Não sabem o que fazer
com a sujeira que estão produzindo. Nada fazem para diminuir o ritmo de
destruição do equilíbrio ecológico pelo qual são responsáveis.
Que peso ecológico podem ter atentados terroristas
quando comparados com a negativa americana de reduzir a emissão de gases
tóxicos? O pequeno ladrão de galinhas é preso. São eles que lotam nossos
presídios. Ladrão de gravata tem direito a tratamento especial. Tem direito à
prisão domiciliar e pode contar com a ajuda “profissional” dos melhores
advogados da praça. “O que fizerdes ao menor dos meus irmãos, a mim o tereis
feito” (Mt 25,40).
Padre Marcos Bach
PORQUE DESAPARECE UMA CIVILIZAÇÃO
A futurologia é incapaz de prever o que as gerações
vindouras vão fazer com os meios de destruição que estão por herdar. Uma coisa
é certa: ou os homens tomam consciência da extensão do apocalipse que estão a
preparar ou então chegará o dia fatal em que será tarde demais para deter o
curso dos acontecimentos.
Toda civilização é condenada a desaparecer um dia.
Também a nossa está fadada ao mesmo destino! O fato de se ter na conta de “cristã” não lhe garante mais tempo de
vida do que lhe permite o grau de saúde social que vier a apresentar. O fator
que determinou o desaparecimento da maior parte das civilizações extintas foi o
que hoje denominamos de injustiça social e luta de classes. Há no processo
evolutivo um ponto em que os elementos destrutivos e desagregadores atingem um
limite crítico.
A Revolução Francesa, como a Russa, estouraram no
momento em que o modelo aristocrático de sociedade classista se tinha tornado
insuportável. Quem acumula em lugar de repartir, abre passagem a uma revolução
semelhante ao que acontece quando um vulcão entra em ação. O mal contém em si o
germe da sua própria destruição. O Apocalipse é o último capítulo de vida de
uma civilização que insistiu em acumular quando já soara a hora de repartir!
Não são apenas as armas acumuladas que ameaçam esta
nossa civilização. É também o dinheiro acumulado nas mãos de uns poucos
magnatas, bem como o poder acumulado e colocado à disposição de uns poucos, que
ameaçam nossa civilização.
São dois os princípios que regem a evolução:
- a lei da entropia
que conduz à desagregação energética e, por conseguinte, à morte todo agregado
material;
- e o princípio da mutação, o qual induz um agregado muito complexo a reorganizar-se
em termos novos, abrindo espaço a novas formas de complexificação.
Quanto mais complexo for um organismo ou organização,
tanto mais evoluído será o seu nível de consciência.
Quando uma civilização desaparece, o fato pode ser
atribuído à ação desagregadora da entropia como do seu oposto que é a
neguentropia. Nenhuma civilização desaparece sem deixar vestígios.
O fim de uma civilização como a egípcia, a grega,
entre outras, não é necessariamente um desastre. É, antes, uma bênção e uma
graça.
A crença de que nossa civilização ocidental e
(pseudo) cristã é a única digna de merecer um lugar na História da Humanidade,
é irrisória. Mesmo em nossos dias, existem muitas civilizações bem diferentes
umas das outras. Cada povo ou raça possui seu modo peculiar de construir o seu
habitat natural e cultural e de viver a sua vida e de organizar a sociedade. É
a esta peculiaridade que damos o nome de civilização.
Totalitarismo e imperialismo são movimentos
destinados a aplastar as diferenças e substituir as divergências por formas
monolíticas de ordem social.
São as religiões e as ideologias totalitárias de
direita e de esquerda as que mais insistem em reduzir as diferenças todas a um
denominador comum a que dão o nome de unidade.
O Criador pode permitir-se o luxo de não repetir
nunca a mesma fórmula. Tudo o que sai de suas mãos possui um toque peculiar só
próprio dele. Originalidade não é o que falta ao Pai Celestial.
Só déspotas e tiranos costumam sonhar com formas
monolíticas de unidade! Nem mesmo o mundo das rochas (lithos, em grego,) é tão uniforme quanto aparenta ser. Nem sequer
tão inerte como convinha à segurança dos nossos arranha-céus. O mundo em que
vivemos não é seguro, dizemos.
Como é que animais e plantas conseguem conviver em
segurança e boa paz dentro dos seus agrupamentos? Nenhuma espécie animal mata
tantos dos seus semelhantes quanto a espécie Homo Sapiens.
O nosso planeta é um
lugar razoavelmente estável e seguro. O desaparecimento do homem poderia
devolver-lhe grande parte da tranquilidade perdida. Mas há outro modo de obter
o mesmo resultado: substituir o atual tipo de homem por outro muito mais
evoluído e consciente; substituir a civilização atual, definitivamente falida,
por outra!
Padre Marcos Bach
COMO AGE A CÉLULA CANCERÍGENA
O ideólogo, isto é, o vendedor ambulante ou não de
ideias preconcebidas prefere o poder ordenador da lei ao primado da caridade. O
amor é uma dessas faculdades humanas com que ainda não sabemos o que fazer.
Onde procurar e/ou topar com o fazendeiro que associa o futuro da sua fazenda
ao das demais propriedades da região? A aranha sabe que a consistência de sua
teia depende de cada um dos muitos fios que a compõem. Onde encontrar o
fazendeiro convicto de que o desenvolvimento da sua fazenda está intimamente
ligado ao de todas as demais situadas na mesma região?
A diferença entre a célula cancerosa e a sadia reside
exatamente aí: uma sabe que não pode crescer sozinha. E a outra se considera a
única no corpo com direito a usufruir das boas coisas da vida.
O ególatra sempre anda de olho aberto para negócios
que lhe possam trazer proveito. Compra um mato e o derruba para vender a
madeira. Depois disso vende a terra e com o dinheiro compra outro mato. E assim
procede em tudo. Não se sente na obrigação de repor o que tirou e de respeitar
a natureza. Saúde e equilíbrio ecológico são para ele palavrões feios.
“Não é o homem senhor da natureza”? A esta pergunta o
empresário responde com a Bíblia na mão: “não sou ladrão, não estou roubando de
ninguém. Estou contribuindo para o progresso do meu país! Se alguém tem alguma
queixa a fazer, que venha falar comigo”!
Foi pensando no lucro de grandes empresários que o
Criador organizou esta maravilha que é a Floresta Amazônica? O homem ao qual a
Bíblia atribui o papel de senhor da natureza não é nem parecido com a figura do
explorador da natureza que tira o que pode e o que não pode, deixando atrás de
si apenas a devastação e um monumental desequilíbrio ecológico!
O futuro do Brasil não depende do que acontece na
Floresta Amazônica ou na Mata Atlântica, dirá alguém. Mentira! O que acontece
nas ruas de São Paulo e do Rio é fruto de uma mentalidade fundamentalmente
antiecológica!
O tratamento político que os colonizadores europeus,
todos sem exceção, deram às suas colônias e feitorias ultramarinas foi
predatório, mais destinado a levar daqui o máximo, não deixando por onde
passaram mais que devastação! Fica muito estranho falar em amor num país
construído mais por exploradores gananciosos do que por pessoas interessadas em
preservar a natureza e legar a seus descendentes um mundo verdadeiramente novo
e melhor!
A palavra ecologia vem do grego, oikos, que significa casa. Ecologia é, portanto, o ramo das
ciências naturais que estuda a maneira sábia como a natureza transformou em
casa habitável o que de outro modo não seria mais que um inferno de seres se
entredevorando.
Uma paisagem ou um braço de mar é uma casa muito bem
organizada e nela não há planta ou animal, seja grande ou seja microscópico,
que não encontre ali a sua morada própria, seu habitat!
Quando século e meio atrás Charles Darwin definiu a
natureza como campo de luta e a evolução das espécies como o resultado de um
processo competitivo (strugle)
cometeu um erro dramático, em tudo análogo ao erro cometido pelos romanos
quando definiram o homem como inimigo do homem: “Homo homini lupus”.
É um insulto afirmar que “lobo come lobo”, porque é
mentira! Se o fizesse já teria desaparecido da face da terra há muitos milhares
de anos!
Que o homem, ao menos
aquele que se considera mais evoluído que os outros, tenda por natureza mais a
desconfiar de seus semelhantes do que a confiar neles, é uma verdade! É mais
fácil encontrar quem se disponha a jogar pedra no telhado do vizinho do que
topar com o bom vizinho disposto a ajudar sempre que for preciso!
Num condomínio de luxo todo mundo cuida da sua toca e
faz questão de ignorar a presença de vizinhos. O conceito de vizinhança é de
natureza ecológica. A palavra vem do latim, vicinus,
que por sua vez vem de vicus, que
significa aldeia, bairro. Existe muito mais solidariedade e sentido de
vizinhança entre os moradores de uma favela do que entre os fazendeiros de uma
região. O filósofo francês Jean Paul Sartre expressou muito bem o que um
fazendeiro do interior brasileiro deve sentir em relação a um potencial invasor
de suas terras: “O inimigo do homem é o outro”.
“Se todos fossem como eu” e trabalhassem como eu, o
mundo seria outro. Este outro mundo seria povoado e administrado por empresários.
Isto é, por gente que vive e enriquece, “roubando” (diria Marx), colhendo o que
não plantou e apropriando-se de parte substancial do fruto do trabalho de seus
empregados!
Padre Marcos Bach
TODA CRIAÇÃO É AMOR
“A suprema natureza do universo é uma energia de
amor”! Quem acha que esta afirmação foi feita por um teólogo se engana, pois
ela foi proferida por um cientista, um físico atômico, para ser mais exato, que,
além disso, é judeu. David Bohm, chama-se o homem que no termo final da sua
vida deixou de lado os aspectos estritamente científicos para se dedicar a
aspectos que hoje são definidos como metacientíficos. Se um físico judeu chegou
à conclusão de que o universo só poderia ser uma linda e maravilhosa “teia de
amor”, que dirá dele um cristão que o contempla como Inácio de Loyola com o
olhar perdido no infinito?
Se Deus é Amor, o universo feito à sua imagem e
semelhança também deve ser “um amor”. No universo material tudo obedece a uma
Lei Fundamental que é a Lei da Gravidade. Cada partícula tende a se unir com
outras para assim formarem conjuntos mais complexos e mais poderosos. Os
cientistas estão empenhados em descobrir qual a energia básica à qual todas as
outras podem ser reduzidas.
David Bohm chegou à conclusão de que esta energia
fontal só podia ser uma “energia de amor”. Neste caso o cosmo, tudo seria em
última instância nada mais que um monumental “Romance de amor”! Outros há que
estão propensos a reconhecer a energia gravitacional como a “fonte primária” de
todas as demais formas de energia. Já se fala da existência de uma
minipartícula subatômica, o gráviton, que seria o responsável por todas as
formas de atração gravitacional, desde a formação de órbitas estelares até a
formação de uma comunidade humana.
Se não existisse o poder de atração que cada mônada
exerce sobre as outras, o universo, como o conhecemos, não poderia existir.
Quando o apóstolo São João disse que “Deus é Amor” formulou uma das Verdades
Fundamentais da fé cristã. Se é verdade o que disse João, então o amor é tão
essencial à constituição do universo quanto o poder criador de Deus. Seguindo
esta linha de reflexão poderíamos chegar à conclusão de que em Deus, Poder,
Criador e Amor são sinônimos. “Deus cria amando e ama criando”. Se Deus é Amor,
Ele só pode ser “Deus” na medida em que ama. A começar por si mesmo, pois
muitos íons antes que existisse o universo criado, Deus só tinha a si mesmo
para amar e ser amado.
É por isso ou de acordo com esta lógica que Jesus nos
aconselha amar a Deus como a nosso próximo e ao próximo como a si mesmo. Ou por
outra: todo amor começa por ser em seu início uma forma de “amor próprio”.
Ascetas houve, mesmo entre cristãos, que nos queriam impor um conceito de
Amor-Caridade baseado no “desprezo de si mesmo”. Jesus reabilitou o amor
próprio colocando-o na base de todo o processo normal de desenvolvimento
afetivo.
Uma ascese que prega a autodestruição e exclui a
autoestima da lista das virtudes é tipicamente pagã e nada tem em comum com os
ensinamentos de Cristo. Foi na Pérsia do sexto século antes de Cristo que
surgiu esta concepção maniqueísta do amor.
Padre Marcos Bach
SÍNTESE COMPLEXA DO UNO COM O MÚLTIPLO
A unidade orgânica e ecossistêmica que a natureza
adotou é uma unidade consentida e livre, e se impõe por si mesma. Criar e
organizar unidades sempre mais complexas: é este o objetivo último de todo
processo evolutivo. Este objetivo perseguem-no tanto os componentes da biosfera
quanto os da noosfera. A natureza pode servir muito bem de modelo, já que nela
todo progresso resulta de uma síntese mais complexa do uno com o múltiplo.
Eliminar as diferenças é o mesmo que enfraquecer o
elo de união que mantém vivo um corpo, seja ele biofísico ou social.
O progresso não é o resultado do acréscimo de
quantidades e números. O progresso biológico é o resultado de “salto
qualitativo”. O progresso não é o resultado de uma soma bem feita. Ele é o
fruto de um processo de ruptura, seguido de recomposição. Não haverá progresso
sem estes dois elementos: a entropia e o seu oposto, a neguentropia.
Nada há no mundo de Deus destinado a durar sempre.
Tudo o que nasce tem data marcada para morrer. O que chamamos de morte é apenas
um momento de passagem entre duas formas de vida.
Francisco de Assis era portador de uma consciência
que lhe permitia viver em comunhão mística com o universo todo. Para ele não
havia nada que não fosse de algum modo “filho” de Deus. O sol era mais do que
uma poderosa usina atômica criado por Deus. Era o irmão sol. O lobo era para ele o irmão lobo. E assim por diante.
Crer em Deus significa crer no homem e no cosmo com a
mesma fé com que cremos em Cristo e na sabedoria do Pai Celestial.
Quando Teilhard de Chardin declarou que amava o cosmo
com o mesmo amor com que amava a Deus, provocou no campo religioso um
verdadeiro escândalo. Escandalizaram-se com esta declaração todos aqueles que
tinham aprendido nas aulas de catecismo que o dever principal de um cristão é
amar a Deus mais do que as criaturas.
Assim como Francisco de
Assis em seu tempo, Teilhard na época atual nos ensina que o maior inimigo da
fé cristã não é a heresia, mas o tempo parado, o tempo do avião estacionado no
aeroporto, do navio ancorado no porto.
A adaptação biológica não consiste tão somente em
submeter-se às exigências de um determinado conjunto de fatores ambientais
previamente estabelecidos. Exemplo é o castor que não a encontrando, cria a
represa de que necessita.
A biosfera está cheia de seres vivos que conseguiram
melhorar as condições do seu habitat
natural. Seria prova de miopia afirmar que o homem nada fez para melhorar as
suas condições de vida.
Tentativas de subverter a ordem estabelecida e de
substituí-la por um novo modelo de ordem não faltaram na história do assim
chamado mundo civilizado.
O comunismo tentou
substituir o indivíduo pelo cidadão. Submeteu a criatividade do indivíduo às
“sábias” prescrições de um corpo de planejadores profissionais. Quem quer que o
futuro seja melhor do que o passado não pode contentar-se com o que uma equipe
de planejadores é capaz de descobrir e pôr em letra de fôrma.
Não podemos entregar o
futuro da humanidade a planejadores. Confiança menor merecem os que se mostram
incapazes de desvincular o futuro da humanidade do seu futuro.
Padre Marcos Bach
A INTEGRAÇÃO DA VIDA É FANTÁSTICA
Os biólogos mais
conspícuos da atualidade nos ensinam que “a Vida é um Todo”, do qual cada
entidade viva participa; que é um “oceano”, dentro do qual cada ser vivo, desde
o mais modesto pé de capim até o homem, se encontra mergulhado; um “banquete”,
do qual todos os membros da Biosfera são “comensais”!
Para ser bom, um
banquete tem que ser animado. Tem que haver música e, acima de tudo, muita
conversa e muita alegria. Tem que ser uma festa! Quem consegue imaginar uma
festa bem animada em que não se ouve “sorriso” algum? Quem entra numa floresta
ainda virgem numa bela manhã de primavera, fica atordoado com o “barulho” que
nela reina! O que num primeiro momento parece ser apenas “algazarra” acaba se
revelando, aos poucos, como “sinfonia” em que cada “grito”, desde o trinado do
sabiá até o urro da onça, se “casa” com os demais.
Lá, onde a natureza
ainda continua virgem e ao mesmo tempo mais “selvagem” do que em qualquer outro
recanto do planeta, tudo tem “sentido” e possui “significado”! Até o uivo da
onça e o ronco do bugio possuem um significado, já que seu autor está “dizendo”
alguma coisa.
Uma floresta é composta
de seres vivos para os quais a “comunicação” é tão essencial quanto o “movimento” o é para um astro! Assim como
declaramos morto um animal que não se movimenta mais, do mesmo modo podemos
considerar como morto e sem vida tudo aquilo que não se “comunica mais”.
O estudo do cérebro está
ocupando, mais do que nunca, a atenção e o tempo dos biólogos de hoje. “A vida
do cérebro é a comunicação”! Seu poder de comunicação cresce e se desenvolve
com a própria comunicação. São milhões os neurônios que morrem ao longo da
vida, mas esta perda é compensada pela formação de novas sinapses por obra dos
neurônios restantes. É por isso que o poder de comunicação como todo permanece
inalterável. Quem sabe, um dia os cientistas vão descobrir que ele até cresce
com o correr dos anos!
Quem produz a
comunicação e tem interesse em se comunicar não é o cérebro, mas a mente. Esta
Mente Universal é que gera na pedra a “consciência” do que é preciso para “ser
pedra”. Uma plantinha, um tufo de capim, sabe como “ser” planta! Ninguém
precisa ensinar-lhe nada, tudo o que a semente precisa “saber”, ela já sabe!
O Universo todo é povoado
por seres que já “nascem sabendo”. O cosmo é “inteligente” numa proporção que
chega a estarrecer e intrigar mentes, como a de um Einstein e de um Teilhard de
Chardin. Os melhores cientistas da atualidade estão chegando à convicção de que
o universo é um mistério, e que em vez de procurar explicá-lo, o melhor que uma
pessoa inteligente pode fazer, é “admirá-lo”!
Padre Marcos Bach
RESPONSABILIDADE ECOLÓGICA
A responsabilidade
ecológica faz parte essencial da consciência cristã e da fé em Cristo. Um
cristão só opera a sua própria redenção na medida em que inclui nela a redenção
da natureza toda. Não lhe basta contentar-se com atitudes de conservação e de
simples exploração. Sentirá pela mãe terra e seus filhos a mesma ternura que
por ela sentiam Francisco de Assis e Teilhard de Chardin.
Seria ótimo se nós cristãos nos desfizéssemos da
ideia falsa de que a salvação de nossas almas é fruto da prática de boas obras
e que o valor meritório delas é proporcional ao esforço que nos impõem. É da
essência da virtude tornar leve e fácil o que sem ela seria pesado e difícil.
Ser cristão não é nem difícil nem pesado. Exige, isso sim, muita coragem e
inteligência acima do comum.
Será que é possível
encontrar sobre a face deste nosso planeta outro ser capaz de cometer tantos
erros e de semear, por onde passa , tantos estragos e tantos problemas?
Nossos técnicos criaram o computador porque queriam
um aliado que contribuísse para melhorar o desempenho da sua inteligência e da
memória em especial. O computador não é um sujeito cujo comportamento não se
pode prever. Basta a mão de um moleque para pô-lo fora de serviço. Podemos
confiar a um sistema cibernético (computador, robô ou piloto automático) muitas
tarefas de natureza funcional, mas seria bobagem esperar que eles possam
substituir-nos na tarefa de conferir qualidade humana a nossas vidas. O que se
passa no interior das consciências não cabe na memória de um computador.
Podemos aperfeiçoar
nossos computadores, sem dúvida, mas isto só não irá acrescentar nada ao
aperfeiçoamento específico da nossa espécie, que é de natureza espiritual, e
tem como palco o interior do homem.
Será que faz sentido modernizar um aeroporto quando
os aviões que o utilizam são apenas pobres teco-tecos? O aperfeiçoamento dos
meios técnicos torna-se ambíguo, equivocado e perigoso a partir do momento em
que começamos a investir mais em pesquisa do que em educação. Quando
aparelhamos nossos aeroportos melhor do que nossas escolas.
É um grande equívoco supor que ao melhorar a
qualidade de nosso instrumental técnico estamos contribuindo, ipso facto, para melhorar a qualidade
humana dos seus eventuais usuários. De que adianta a qualidade técnica de um
avião se o homem que o dirige é um assassino profissional?
Para que serviria a
liberdade num universo completamente entregue à ação de forças cegas e mais
poderosas do que tudo o que costumamos associar a conceitos como inteligência e
vontade livre? Um universo onde não há lugar para o novo e a novidade é o
espaço preferido dos que se adonaram da vontade livre dos homens. Mais numerosa
ainda do que a plêiade de soberanos absolutos é a sua legião de súditos.
Padre Marcos Bach
CONTATO COM A VIDA
“Pereat
veritas, fiat vita”. Nietzsche não deixa de ter um bocado de razão: “De
tanto nos ocupar com a verdade acabamos perdendo o contato com a vida”.
Com a vida humana, em especial. Quem mata e manda
matar do jeito como este afazer foi praticado nos últimos cem anos, não pode
dizer que ama a vida. Quem vive a espécie de vida que se vive hoje nas grandes
cidades, não tem credibilidade moral quando se proclama amante da vida. Quem
tem amor à vida a ama em todas as suas manifestações. Este amor se manifesta em
todas as frentes onde ela corre perigo.
Declarações sobre a dignidade da pessoa humana e o
respeito à vida não é o que falta. Nenhuma delas impediu até hoje a matança de
baleias inermes e inofensivas, a extinção simples e pura de espécies animais
inteiras, para não falar no aborto e na matança pela fome. A terra é generosa,
os homens é que não o são. A fome é o subproduto da falta de generosidade da parte
mais rica da humanidade. Os cristãos representam o grosso desta parcela
opressora e exploradora da humanidade. Isto significa que não compreenderam em
absoluto o seu Mestre. “Ut habeant vitam...”
“Eu vim para que os homens tenham vida”.
Não aquele mínimo de vida que mal dá para a
sobrevivência. Aquele que passou a existência no limiar que separa a vida da
inanição, não chegou a viver de verdade. Como se pode falar em vida espiritual,
saúde psíquica, onde a sobrevivência física não vai além do nível vegetativo? E
não é apenas o faminto subnutrido que, via de regra, não faz mais do que
vegetar. O rico opulento que devora a comida, o sexo e o dinheiro, também é um
mero vegetal travestido de homem. A fome e a voracidade não costumam inspirar
bons pensamentos. Também não têm o poder de nutrir bons sentimentos e
aspirações de alto nível espiritual.
Fizeram bem os bispos da América Latina quando de
público se colocaram do lado da multidão milionária de famintos e subnutridos
deste Continente. Se a intenção deles não foi a de acabar com a fome (e não
apenas com os famintos) seu gesto não terá sido mais que um truque demagógico.
Todo o mundo sabe que declarações e discursos nunca mataram a fome de ninguém.
Só há um jeito de matá-la: comer.
O ato de comer está tão
profundamente ligado à vida, que pão e vinho acabaram se transformando em
símbolos da manifestação da forma mais sublime de vida, que é a Vida de Fé. O
ato de comer tem para o homem um significado que ultrapassa o plano vegetativo
de um modo absolutamente radical. Comer passa a ser um modo de alimentar o
espírito. “Quem comer deste pão viverá eternamente” (Jo 6,51). É por esta razão
que a falta de pão na mesa do pobre é tão trágica. Pela mesma razão não pode
haver lugar na “mesa do Pai” para os ricos e vorazes glutões.
Padre Marcos Bach
INSENSATEZ HUMANA
Que a humanidade está
necessitando de um vigoroso empurrão para impedi-la de continuar a seguir a
rota suicida que está trilhando é tão elementar e óbvio que não é preciso ser
um Sherlock Holmes para percebê-lo. O Papa, como os porta-vozes dos países mais
ricos do planeta (Oito Grandes), falam e agem como se o futuro da humanidade
estivesse assegurado. Basta crer na Igreja por ele governada, diz o Papa. Basta
ser fiel às leis do Mercado, dizem os Oito Grandes.
Vida é movimento, como tudo no universo. Se assim é,
só pode haver vida onde há movimento. Inércia é, portanto, sinônimo de morte.
De que adianta pregar o amor à vida e promover uma cultura da vida quando a
maior parte da humanidade mal consegue o mínimo para sobreviver?
O homem moderno tem
pressa: quer extrair do seu corpo o máximo de prazeres que este lhe pode
proporcionar! Quer tudo dentro do menor prazo possível!
Ora, a vida não é
imediatista. Os processos evolutivos são lentos. A natureza é paciente. Sabe
que são necessários milhões de anos para amadurecer o aparecimento de uma nova
espécie biológica. O homem que se autodefine orgulhosamente de “moderno”,
especializou-se na arte de ignorar os ritmos e a sabedoria da natureza. Por
isso sua “civilização” transformou-se toda ela num monumental atentado à
natureza.
Este mesmo homem mente quando se diz cristão. Jesus
de Nazaré não era um homem apressado. Sabia que o fermento necessita de tempo
para agir. “Non multa, sed multum”,
diz um provérbio romano.
O objetivo da vida cristã não consiste em realizar
muito em pouco tempo, mas em viver intensamente tudo o que é possível vivenciar
neste espaço de tempo. Teresinha de Lisieux morreu com 24 anos. Francisco de
Assis tinha 44 anos quando morreu. Jesus quando morreu tinha pouco mais de 30
anos.
Um monge budista nunca
tem pressa. Quem entra no jardim de um mosteiro tem a impressão de ter
penetrado num mundo em que o tempo parou. Existe num mosteiro budista uma
despreocupação em relação ao passar do tempo que escandaliza o agitado homem
ocidental. O oriental raciocina assim: “A evolução espiritual da humanidade
requer tempo”! Tempo e vagar, vagar e paciência! O raciocínio do homem
ocidental é outro: “A evolução da humanidade depende da capacidade humana de
acelerar o ritmo da História”.
Na mente de um capitalista esta aceleração coincide
com o ritmo de crescimento econômico, que por sua vez coincide com o aumento
cumulativo de capital. Um marxista inveterado atribui o mesmo efeito benéfico
ao trabalho. Tanto um como o outro estão certos e errados, ao mesmo tempo. A
solução final não será o resultado de uma luta de classes, de explorados contra
exploradores, mas de uma síntese.
É nesta direção que um
sociólogo e um político terão que orientar suas reflexões se quiserem escapar
do naufrágio ideológico, ao encontro do qual se estão dirigindo tanto os
defensores da liberdade de mercado, quanto os órfãos do Estado-Providência.
É evidente que há situações em que é preciso ter
pressa. Quando o fogo ameaça destruir uma casa ou uma floresta, de nada adianta
invocar a Sabedoria de Deus. A vida humana é tecida de momentos em que é
preciso preocupar-se mais com o tempo do que com a eternidade. A vida cristã
não exige do crente que opte entre viver no tempo ou na eternidade. Para um cristão
autenticamente fiel à sua fé em Cristo não existe antagonismo entre tempo e
eternidade. Seu tempo é eterno e irreversível, não está sujeito à ação da
entropia como o tempo biológico. Sua eternidade não o coloca em conflito ou
contradição com o tempo histórico. Um cristão deveria crer na História muito
mais do que Marx. Não deveria encarar a História passada da humanidade como uma
espécie de “camisa de força” que é preciso vestir.
Um discurso moral acerca
do valor da vida é hipócrita quando não inclui os demais aspectos da vida e não
apenas o biológico. O mandamento que proíbe matar pessoas não se refere tão
somente à vida físico-corporal. Há muitas maneiras de matar, como há muitas de
praticar o suicídio. Nosso mundo está cheio de assassinos e suicidas.
Representam já uma espécie à parte. Seu discurso é difundido por todos os meios
de comunicação de massa e pode ser resumido nestes termos simples: “carpe diem”. “Aproveite o dia de hoje!”.
“Comamos e bebamos porque amanhã morreremos” (Isaías 22,13 e I Cor 15,32).
Padre Marcos Bach
DIMENSÃO DO PROBLEMA ECOLÓGICO
Nós, homens da
civilização ocidental, estamos convencidos de que através de nós a humanidade
atingiu o grau mais alto de racionalidade e inteligência. Esquecemo-nos de que
inteligência sem consciência é como um barco sem leme, sem bússola e sem motor
ou vela. Agimos impelidos pela necessidade e pelo desejo da compensação
imediata. Somos imediatistas, desacostumados a olhar para além do horizonte de
nossos interesses momentâneos. Entre nossos direitos incluímos o de sujar a
face da Terra e de meter a mão nos seus recursos sem a menor consideração para
com as gerações futuras. Não há leis e medidas punitivas capazes de mudar a
cabeça e o coração das pessoas. Só um grande amor consegue este milagre.
Será que a humanidade se
encontra realmente à beira da extinção como espécie biológica?
Ao messianismo materialista e caolho de Adam Smith e
Karl Marx é preciso contrapor o genuíno messianismo encarnado na pessoa e na mensagem
de Jesus Cristo. Ele foi pobre e pregou o espírito de pobreza. O ser humano não
necessita da abundância material dos países ricos. O corpo humano é pouco
exigente em matéria de alimentação e vestuário, a não ser que tenha sido viciado
pelo consumismo.
Um corpo saudável faz
poucas exigências materiais. Não necessita da maior parte dos produtos
encontrados em lojas, supermercados e farmácias: ar puro, água limpa, alimento saudável,
além de muito exercício e movimento ao ar livre.
Pode-se dizer sem medo de exagero que as necessidades
normais de um corpo sadio são mínimas. O peso maior das necessidades humanas é
de ordem espiritual. Estão relacionadas com o desenvolvimento das
potencialidades inesgotáveis da Mente e do Coração.
Há quem diga que a
catástrofe ecológica já passou a ser inevitável. Não é que tenhamos ido longe
demais. Os recursos necessários para reverter a situação são simplesmente
fantásticos. O dinheiro que está sendo gasto em armas não passa de uma gota de
água comparado com o montante de recursos financeiros necessários. Nenhum
dinheiro será suficiente se não vier acompanhado de uma decidida vontade
política e moral. Mesmo onde esta última existe, ela não ultrapassará os
limites da “boa intenção”, se não vier acompanhada de gestos bem concretos e
muito generosos de renúncia. Abrir mão de “direitos adquiridos”, baixar o seu
padrão de vida, contentar-se com menos, tudo exige esforço, mas é absolutamente
imprescindível se queremos safar-nos da confusão ecológica em que nos metemos
por culpa própria.
O interior das
consciências está em situação muito pior do que a atmosfera de nossas metrópoles.
Padre Marcos Bach
AFINIDADE COM A NATUREZA
Existe entre a natureza
e a consciência do homem uma afinidade ontológica. O ser humano é matéria de um
extremo ao outro. É, ao mesmo tempo, espírito de ponta a ponta. Foi um erro
metafísico atribuir-lhe uma dupla natureza, a material e a espiritual. O homem
é por essência um ser em que espírito e matéria encontraram a mais inteligente
forma de convívio. Só uma sociedade competitiva como a nossa consegue ignorar o
princípio de acordo com o qual o que determina a ordem não é a “lei da
fidelidade”, mas o espaço reservado à opção criativa.
Tudo indica que a natureza está muito menos amarrada
ao passado do que certas instituições sociais criadas pelo homem. Todos os
autocratas invocam a natureza como avalista de suas pretensões monárquicas. A
natureza, ao que tudo indica, tende a fazer do convívio solidário o indicador
de ordem por excelência. Parece que a natureza tende a construir um ambiente em
que todos se deem bem com todos.
A esperança cristã
inclui em suas perspectivas a qualidade material da vida aqui na Terra, muito
embora seu objetivo específico sejam as promessas de vida eterna, feitas por
Jesus. É típica da esperança cristã a interação permanente entre sua dimensão
terrena e a dimensão escatológica. Sem a certeza de uma continuidade
pós-histórica, a vida da maioria das pessoas não seria mais que um pesadelo. O
que mais atormenta o ser humano são os seus desejos. Uma civilização consumista
como a nossa, apostada em atiçar o desejo e criar necessidades novas além das
que já oprimem o homem moderno, encontra-se totalmente fora do horizonte da
esperança cristã.
Parece que a humanidade
ainda não superou a fase da palmatória. Só aprende forçada pelo sofrimento. O colapso
dos sistemas ecológicos não mexe com a consciência das pessoas. Em termos de
consciência ecológica não existe diferença entre crentes e ateus. Em todos eles
o grau de inconsciência é o mesmo. Do diálogo entre teólogos cristãos e
ideólogos marxistas ou freudianos pouco proveito resulta, via de regra, por lhe
faltar o essencial que é o amor à natureza.
Padre Marcos Bach
PARADIGMA HOLOCINÉTICO
O paradigma novo que só
com grande dificuldade consegue impor-se é o Paradigma holístico ou
Holográfico. Talvez fosse mais exato denominá-lo de Holocinético. A um
observador da natureza inspirado na concepção holocinética, a Mãe Terra se
apresenta como um Todo onde cada parte é simultaneamente Todo e Parte.
O Todo não resulta da soma das partes, nem sequer de
sua interação, mas é o Todo que se expande, se traduz e se realiza em cada
parte. É evidente que se levarmos a lógica desta concepção até às suas últimas
implicações vamos ter problemas em praticamente todas as áreas do organismo
social do qual deduzimos a nossa identidade cultural. Religião, Política,
Economia e Ética: em todos estes campos haverá, sem dúvida, “terremotos” bem
sérios antes que venhamos a substituir nossos antiquados paradigmas Newtonianos
e Cartesianos por outros novos.
Embutido no âmago desta
transição encontra-se muito mais potencial “revolucionário” do que nas teorias
messiânicas de Marx. O movimento ecológico só terá êxito se vier a desembocar
numa verdadeira “revolução cultural”. Uma nova “Escala de valores”, um novo
modo de atender às necessidades fundamentais da Humanidade, isto e muito mais
será consequencia inevitável da passagem da concepção aristotélica do universo
para a visão holocinética.
O que está em jogo em nossos dias não é tanto a
preservação da natureza, seriamente ameaçada pela imprevidência do homem, quanto
à concretização de um novo Pacto Cultural do Homem com a Natureza.
Para começo de conversa
serão necessárias duas guinadas violentas no campo do pensamento. O homem terá
que redefinir sua identidade como agente histórico. Terá que redefinir seu
conceito de ordem natural.
A natureza não pode continuar a ser vista como uma
espécie de “Trono” destinado ao papel de suporte da grandeza do Homem. Ela não
foi criada para servir ao homem, nem o homem para servi-la. A legítima relação
do homem com a natureza não é análoga à relação entre senhor e servo. Não é
baseada nalguma espécie de supremacia, seja do cultural sobre o natural ou
vice-versa. Não é uma relação de poder, mas de solidariedade. Nela o poder está
presente, mas sob a forma do Amor.
Ambos, tanto o ser
humano quanto a trama admirável que une entre si milhões de micro-sistemas
ecológicos são realidades convergentes, pois, além de serem frutos do mesmo
Amor, se destinam à mesma Plenitude Final. Estão unidos para todo o sempre por
um destino comum que é o de constituírem o Corpo Místico de Cristo, ponto de
partida (Alfa) e ponto de re-encontro de toda a criação, segundo o belo
pensamento de Paulo Apóstolo. A natureza é sagrada, tão sagrada quanto o homem.
Padre Marcos Bach
O CRISTÃO DIANTE DA NATUREZA
Quando vou até a beira de um rio o primeiro
sentimento que me empolga é o da admiração. Mas logo em seguida, vendo a cor
das águas e a sujeira acumulada ao longo de suas margens, sinto-me ofendido.
Sinto-me atingido em minha consciência, pois sei da minha solidariedade
responsável com a natureza toda.
Quem conspurca um rio está colocando lama
dentro da minha própria casa.
Só se pode contemplar
com o olhar de Deus o que se ama, o que se protege e defende contra a ganância
brutal e imbecil do homem de mente subdesenvolvida.
Todo cristão, em razão
do batismo, é posto como intermediário entre o universo e Deus. Cada ser humano
é, de certa forma, a síntese mais poderosa de todas as energias que emanam de
Deus e constituem o universo. Um cristão não pode situar-se frente à natureza
com a desenvoltura cínica de um conquistador.
Hoje se insiste tanto em despertar no povo o sentido
ecológico. E há boas razões para fazê-lo. A consciência ecológica é fundamental
não só para a sobrevivência do homem como espécie biológica, mas, acima de
tudo, como plataforma de lançamento de qualquer projeto religioso e espiritual
digno de fé.
Quando um cristão
contempla a natureza, vê mais, infinitamente mais do que matéria-prima ou
recursos naturais destinados a alimentar a voracidade implacável da máquina do progresso.
Quem, ao depositar seu voto na urna, não se pergunta:
será que estou votando em alguém comprometido com o futuro da humanidade? Se
for um pouco mais consciente que a maioria dos eleitores inscritos, terá a
convicção de que só um político comprometido com o futuro ecológico do planeta
está realmente compromissado com o futuro da humanidade.
Aqueles que chegarem à
conclusão de que o futuro da humanidade não é mais um problema vinculado a esta
ou aquela religião ou Igreja, mas uma questão ecológica, tenderão fazer da
evolução futura do homem um capítulo intimamente ligado ao modo como o homem
vier a se relacionar com a natureza, isto é, com as potencialidades mais sutis
do mundo material.
Se o conhecimento é em
sua essência um modo pelo qual o homem se identifica todo com a realidade,
então o conhecimento por excelência é aquele em que o homem todo se identifica
com a realidade toda.
Padre Marcos Bach
A COMUNICAÇÃO NA NATUREZA
Quem entra numa floresta
ainda virgem numa bela manhã de primavera fica atordoado com o barulho que nela
reina. O que num primeiro momento parece ser apenas algazarra acaba se
revelando, aos poucos, como sinfonia em que cada grito, desde o trinado do
sabiá até o urro da onça, se casa com os demais.
Lá, onde a natureza
ainda continua virgem e ao mesmo tempo mais selvagem do que em qualquer outro
recanto do planeta, tudo tem sentido e possui significado. Até o urro da onça e
o ronco do bugio possuem um significado já que seu autor está dizendo alguma
coisa.
Uma floresta é composta de seres vivos
para os quais a comunicação é tão essencial quanto o movimento o é para um astro.
O universo todo é
povoado por seres que já nascem sabendo. O cosmos é inteligente numa proporção
que chega a estarrecer e intrigar mentes como a de um Einstein e de um Teilhard
de Chardin. Os melhores cientistas da atualidade estão chegando à convicção de
que o universo é um mistério e que em vez de procurar explicá-lo, o melhor que
uma pessoa inteligente pode fazer é admirá-lo.
Comunicar-se é trocar
informação. Por informação se pode entender um conhecimento que se quer
repartir com um outro. São muitos e extremamente variados os modos como os
seres vivos se comunicam entre si. A linguagem é extremamente rica, complexa e
diferenciada. O grito de uma ave sempre contém uma informação e se destina a
alguém. Este alguém pode ser um companheiro, mas também pode ser um inimigo.
Não é apenas o som que é
usado como meio de comunicação. A cor e o cheiro também fazem parte da
linguagem que os seres vivos usam para se comunicar entre si. A luz do
vaga-lume serve menos para iluminar o caminho do que para marcar presença. O
perfume da flor serve menos para chamar a atenção de insetos de cuja cooperação
a planta precisa para a reprodução. Animais há que usam a cor para despertar o
interesse sexual de um eventual parceiro. Entre os animais são os machos que
mais apelam para este recurso, mas, entre os humanos, são “fêmeas” que fazem da
beleza o meio preferido de atrair sobre si a atenção de um parceiro do sexo
oposto. Qual o país que não possui a sua Miss! Um varão se sentiria pouco à
vontade no papel de Mister Universo. A beleza torna frágil e vulnerável a quem
a possui. Não é por acaso que o “sexo belo” é também ao mesmo tempo o “sexo
frágil”!
A beleza faz parte dos meios de
comunicação de que a natureza se serve para transmitir mensagem e informação.
Padre Marcos Bach
A NATUREZA FIEL AO CRIADOR
O Criador organizou a natureza fazendo dela uma
espécie de “casa comum de todos os viventes”. A palavra Ecologia vem de oikos, que em grego significa casa. O
que fizeram do nosso planeta os “amigos” do progresso? Não sabem o que fazer
com a sujeira que estão produzindo. Nada fazem para diminuir o ritmo de
destruição do equilíbrio ecológico pelo qual são responsáveis.
Que peso ecológico podem ter atentados terroristas
quando comparados com a negativa americana de reduzir a emissão de gases
tóxicos? O pequeno ladrão de galinhas é preso. São eles que lotam nossos
presídios. Ladrão de gravata tem direito a tratamento especial. Tem direito à
prisão domiciliar e pode contar com a ajuda “profissional” dos melhores
advogados da praça. “O que fizerdes ao menor dos meus irmãos, a mim o tereis
feito” (Mt 25,40).
A impressão de que Deus abandonou os “pequeninos”, os
pobres diabos, entregando-os à ganância de especuladores e exploradores, é
falsa. Não são eles, os magnatas do comércio, das finanças e da indústria
bélica que se encontram no comando do barco da História. Os mais decisivos
capítulos da História (com H maiúsculo) estão sendo escritos com suor e
lágrimas de sangue no dia a dia da vida da legião de pobres.
Nada do que é decidido por tecnocratas insensíveis em
gabinetes com ar condicionado merece a atenção de um historiador sério. O que é
“decidido” em campos de batalha não dura mais tempo do que o necessário para
montar o cenário para a guerra seguinte. O verdadeiramente decisivo do ponto de
vista histórico é o que acontece no coração dos homens.
A História não é o resultado final de uma síntese de
equações racionais. A História é o resultado de tudo o que a humanidade sente.
Nada há de mais imprevisível do que o sentimento humano. Aparentemente nada
existe em nosso interior de mais irracional e destemperado do que o sentimento.
Mas é só aparência. “O coração possui razões que a razão desconhece”, dizia
Pascal. O que não podemos fazer é confiar-lhes o comando das nossas ações e
reações. Só são positivas e aproveitáveis quando mantidos dentro de certos
limites.
Sabedoria, discernimento, prudência e vigilância são
virtudes na medida em que são medidas e não fins em si.
Excesso de prudência e racionalismo exagerado deixam
de ser virtudes a partir do momento em que concedem ao medo mais espaço do que
à ousadia. E ao que parece mais seguro e menos arriscado é a última palavra em
suas decisões.
Discernimento chama-se a virtude que capacita uma
pessoa a evitar dois extremos igualmente nocivos: o excesso de medo de ir longe
demais; e o excesso de confiança em seus próprios impulsos e sentimentos.
São dois os terrenos em que é preciso instalar um
sistema vigoroso de vigilância psicológica e moral: o da liberdade e o do amor.
São eles os campos em que se irão travar daqui para frente as grandes e mais
decisivas batalhas da humanidade, liderada por representantes da sua parcela já
redimida.
Um fato que pouco pesa na balança dos políticos é a
condição humana de Povo Redimido e não mais escravo do pecado como antes que
Cristo o viesse libertar.
Já existe no seio da humanidade uma parcela
efetivamente redimida da qual se pode esperar atitudes que o “homem carnal”,
como o chama o apóstolo Paulo, é incapaz de assumir. Esta parcela redimida e
liberta é pequena e sua presença é discreta, mas são eles, estes homens e estas
mulheres, que carregam em seus ombros o futuro da humanidade inteira. Não
possuem cargos e títulos que os credenciem ao desempenho desta função
eminentemente profética. Não pertencem à cúpula hierárquica de uma Igreja
cristã. São os “pequeninos” (Lc 10,21) de Jesus e que formam o “pequeno
rebanho” (Lc 12,32) a porção predileta dos eleitos de Jesus. A única autoridade
de que dispõem é a que lhes proporciona a sua Fé em Cristo e o Amor com que O
amam. Não possuem nenhum poder de jurisdição, pois não necessitam que alguém
lhes imponha as mãos. Seu poder vem de dentro deles e sua origem é divina. É
este o Poder que derruba montanhas de preconceitos e de bloqueios humanamente
impossíveis de serem desativados.
Padre Marcos Bach
CONSCIÊNCIA DE CIDADANIA
Político genial e com visão de estadista é aquele que percebe a tempo que
só se pode mudar uma sociedade e o seu habitat
que é a cidade, mudando a cabeça das pessoas. Pessoas com mentalidade
esclerosada são conservadores por natureza. A criança, no entanto, tem sede de
saber e de compreender. Seu pequeno cérebro ainda lhe permite mudar de ideia.
Ao contrário do hiper-adulto ela ainda não possui convicções inabaláveis.
Se queremos recivilizar
a face do nosso planeta temos que começar pelas cidades. Inicialmente por
aquelas que ainda são civilizáveis. E a
recivilização das cidades só pode ser realizada ao longo de muitos decênios e
com a colaboração das crianças de hoje. Quanto mais cedo elas vierem a se
entusiasmar pela perspectiva de que podem participar da construção de uma
cidade totalmente diferente das de hoje, tanto maiores são as chances de
redesenhar o perfil urbanístico de nossas paisagens.
Um Prefeito de Nova York confiou a educadores e não a técnicos a tarefa de
transformar a cidade num centro cultural de alto nível. As cidades gregas eram
centros comerciais e culturais de alto nível.
Usamos o termo cidadania
sem nos lembrar de que o termo cidadão se refere a alguém que tem consciência
de que pertence a uma cidade, cujo nome não pode desonrar, como não pode
desonrar o nome da sua família.
Cidadão é e só pode ser
alguém que tem consciência e um mínimo de amor à sua cidade natal. Como em
nossos dias as pessoas mudam de cidade com extrema frequência, fica difícil
identificar-se com a cidade em que se vive até o ponto de amá-la e de se
apaixonar por ela. Ninguém mais se empolga com a perspectiva de morrer pela pátria
ou a de defender a sua cidade até a morte. Será que aquilo que não conseguiu
despertar em nós um mínimo de amor, ao menos merece ser classificado como valor
existencial?
Padre Marcos Bach
A IMPORTÂNCIA DO CONTATO COM A TERRA
O amor à terra é um dos requisitos básicos de uma genuína fé em Cristo. Para
Teilhard de Chardin este requisito é inseparável do amor ao
céu. O amor de um cidadão por sua cidade é, em última análise, um prolongamento
e uma extensão do amor que nutre por sua casa. Poderá um morador de rua sentir
por sua cidade o mesmo amor que o morador de uma vila luxuosa sente por ela?
O escritor inglês Graham Greene chama os grandes prédios de apartamentos
de “máquinas de morar”. O espaço que os membros de uma família ocupam e a
atmosfera que respiram em comum determina e qualifica ou desqualifica o convívio
familiar muito mais do que a quantidade ou qualidade dos móveis que lá se
encontram. A mania de erguer prédios altos, arranha-céus, quando existe ainda
tanto espaço horizontal inaproveitado, só pode ser interpretado como falta de
sensatez política.
Na medida em que uma população perde o contato com o chão e com o solo
vivo, perde o contato com a natureza e com o mundo animal. Os romanos incluíam
os animais domésticos entre os membros de uma família. A amizade de um cão ou
de um gato supre, em muitos casos, a falta de calor humano.
A palavra humildade vem
do latim “humus”, chão. Humilde é a
pessoa que ama a terra e permanece em comunhão com ela. O “nefelibata” ou
morador das nuvens aceita morar nas nuvens, longe do chão, mas perde assim uma
das dimensões mais preciosas da sua consciência que é a dimensão telúrica, a
consciência da sua íntima ligação com a terra (telus, em latim). Tirar a cidade das nuvens e colocá-la novamente
em contato com o ambiente em que plantas e animais lançam suas raízes e fazem
seus ninhos é tarefa para artistas e não pode ser entregue a tecnocratas frios
sem alma. Temos que domesticar nossas cidades, que hoje mais se parecem como o
Faroeste americano era cem anos atrás.
Padre Marcos Bach
CIDADES VIÁVEIS E CONFORTÁVEIS
É por absoluta falta de imaginação que a humanidade persiste em cometer
sempre de novo os mesmos erros. As nossas cidades são verdadeiras aberrações
urbanísticas. Onde encontrar uma cidade com casas voltadas para um pátio interno,
donde é possível contemplar ao menos uma fatia de céu estrelado? Onde topar com
aquela praça tranquila e segura onde é possível encontrar-se com amigos e
vizinhos para um bom chimarrão, uma rodada de cerveja ou até mesmo para um
sarau ou serenata improvisada na hora? Produzir música em vez de se contentar
com escutá-la tão somente: é disto que a boa saúde psíquica de uma pessoa
depende mais do que de cansativas e prolongadas sessões de psicanálise.
Grandes inimigos da cidade moderna são os especuladores imobiliários e
seus absurdos prédios e edifícios dum lado, e os automóveis do outro lado.
Acabar com a especulação imobiliária e com a ditadura do automóvel poderão
tornar-se, com o correr do tempo, medidas absolutamente indispensáveis para
devolver aos nossos centros urbanos um pouco da saúde perdida ou seriamente
ameaçada.
Da palavra latina “civitas” vem
o termo cidade e a palavra civilização. Para corresponder a esta sua origem
semântica comum, a cidade deveria ser a porção mais civilizada do habitat humano. Longa é a estrada que a
humanidade percorreu desde que deixou para trás a caverna e foi morar em
cidades.
A palavra política vem da palavra grega “polis” e se refere à arte de levar a caverna do fundo de um
inóspito grotão para um terreno mais favorável, onde o solo era mais fértil e
havia água em abundância. A cidade, como a vida urbana em geral, que poucos
decênios atrás eram solução, hoje são mais problema do que solução. A falta de
conforto, de segurança e de água potável são apenas um dos fatores que fazem da
vida de um paulistano uma antecipação do que poderá vir a ser um dia o
“inferno”.
O alemão Clausewitz define a política como “a arte do possível”. Seria
perda total de tempo e de recursos tentar salvar cidades do tamanho de São Paulo
ou México City. Mas é perfeitamente possível salvar cidades pequenas com uma
população em torno de 20.000
a cem mil habitantes.
Padre Marcos Bach,sj
BELO EXEMPLO DA NATUREZA
A natureza oferece um
belo exemplo de como ajustar num todo harmonioso formas tão diferentes de seres
vivos. Animais caçam, mas não sabem o que é fazer guerra.
A criação de um mundo sobrenatural só acontece lá onde uma civilização
perdeu o contato com o mundo natural. Os Imperadores Romanos só passaram a
exigir honras divinas na fase decadente do Império, quando este já se parecia
mais com um vasto Campo de Concentração do que com o que tinham sonhado Catão e
Cícero.
Todos os tiranos e monarcas absolutos atribuem seus poderes a entidades
superiores, procurando, desta forma, justificar a sua falta de contato com a
vontade popular.
O que melhor caracteriza a pessoa de um cientista moderno, verdadeiramente
moderno, é a humildade. Um cientista verdadeiramente sábio não perde o contato
com o chão (humus, em latim). Não
ignora que é filho da natureza, cidadão do planeta Terra, irmão do lobo e do
golfinho. Werner von Braun, um dos pioneiros da Era Espacial Moderna, dá a esta
atitude o nome de “humildade”. O verdadeiramente sábio, filósofo ou cientista,
sabe que o que sabe não tem comparação alguma com o que ainda lhe resta
apreender.
O sábio verdadeiro não é
apenas a “enciclopédia ambulante” da época em que ainda era possível saber
tudo. Hoje consideramos sábio de verdade aquele que tem conhecimento dos aspectos
essenciais da Realidade Global. Além disso, nossos cientistas nos ensinam que
saber e saborear são sinônimos. Físicos atômicos chegaram à conclusão de que a
diferença entre certas partículas subatômicas tem a ver com sabor. Até o mais
despretensioso elétron sabe que sua tarefa não se resume em registrar
informações. Ou em fornecê-las.
In: Manuscrito.
CONSCIÊNCIA PANENTEÍSTA
A consciência religiosa
do homem primitivo era panteísta. Para ele o humano e o divino, o natural e o
sobrenatural, não eram realidades distintas e separadas. Sua concepção era
essencialmente imanenteísta, isto é, voltada para as manifestações da realidade
material e do tempo presente. Passava seus dias dentro dos limites acanhados de
um horizonte estreito e sem nenhum espaço para momentos de ruptura. Era uma
consciência tranquila, perfeitamente ajustada ao ambiente natural e adaptada ao
sistema social em vigor. A “consciência tranquila do Carvoeiro da Bretanha”,
conhecido por seu apego ao passado, já foi tida como expressão modelar da
consciência cristã. Consciências pacatas e tranquilas fazem parte de um nível
religioso e moral primitivo.
A religiosidade do tipo
panteísta leva o homem a imergir de corpo e alma no seio da Mãe Natureza. A
natureza possui, para ele, a sacralidade que para o feto possui o útero da mãe.
A nenhum embrião ocorreria a ideia absurda de “explorar” o seio da mãe. Para um
primitivo a natureza é seu útero. Sua consciência religiosa o impede de cair na
tentação de sucateá-la em nome da razão e do progresso, como fazem os cristãos.
Integrado por completo no mundo em que vive, desconhece a maioria dos problemas
psíquicos que tanto afligem o chamado homem moderno. É em certo sentido mais
feliz que ele. Podendo atender as suas necessidades físicas, dá-se por
satisfeito. Não tem a menor ideia a respeito da famosa angústia existencial, já
que em sua consciência difusa não há um departamento destinado à religião e um
outro encarregado de prover as necessidades da vida. A natureza é para ele um
paraíso em que se sente tão à vontade como o peixe na água. Mas o paraíso está
fechado. O Homo Sapiens descende de
uma geração que foi expulsa do paraíso por um decreto irrevogável do
Todo-Poderoso.
In: Manuscrito.
SÃO FRANCISCO E A NATUREZA
O homem pertence ao mesmo nicho ecológico que os demais membros do
universo em que vive. Francisco de Assis chamou o sol de “irmão” e a lua de
“irmã”. O lobo é para ele o “irmão lobo”. A consciência de pertencer a uma
grande família universal faz parte dos aspectos essenciais de uma bem evoluída
consciência cristã.
A arte milenar de
cultivar a terra e de servir-se dos recursos da natureza com a consciência de
que há um limite além do qual não é permitido ir, cedeu lugar em grande parte
do mundo a um modo extremamente predatório de tirar proveito da exuberante
generosidade da Mãe Natureza. A agricultura deixou de ser uma arte e fonte de
vida para tornar-se um negócio, o agronegócio. Criamos frangos, bois e porcos
aos milhões para exportar a carne. O negócio não está mais em produzir para
consumir, mas em produzir para exportar!
Amorização é a palavra que Teilhard de Chardin emprega para definir este
projeto monumental e de dimensões cósmicas. O nível de consciência que lhe corresponde
é a consciência cósmica, pela qual uma pessoa toma consciência de si como parte
integrante de uma totalidade tão ampla quanto o universo todo.
A consciência de um cristão autêntico é essencialmente cósmica, pois o
Deus em que deposita sua fé se manifesta a ele através do universo material. O
grande Livro da Natureza, desde o átomo até a galáxia, está repleto de
informações, dizendo-nos quem é Deus. Para o apóstolo Paulo quem não crê em
Jesus, ainda pode ser desculpado, mas quem, ao contemplar o firmamento e os
mistérios da natureza não crê em Deus, este não tem desculpa. " De fato, desde a criação do mundo, o invisível de Deus - o eterno poder e a divindade - se torna visível à inteligência de suas obras. Assim eles se fazem indesculpáveis" (Rm 1,20).
A presença de Deus na vida dos homens é elemento fundamental da fé em
Cristo. O Evangelho de Tomé cita uma palavra de Jesus que realça a importância
desta tese. “Levanta uma pedra e debaixo dela me encontrarás”.
Quem não aprendeu a encontrar Deus nos pequenos detalhes da vida
cotidiana, também não vai encontrá-lo na Basílica de São Pedro. O mundo que nos
cerca está repleto de maravilhas que na sua simplicidade nos falam do Amor de
Deus de forma mais convincente do que o mais eloquente sermão.
In: Manuscrito de Pe. José Marcos Bach, sj
MAIOR CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA
Quem quer medir o nível
de consciência de uma pessoa deve tomar como critério básico a sua capacidade
de dirigir-se por si mesma. Em seu nível mais rudimentar esta capacidade se
manifesta como instinto e como determinismo psicológico. O instinto determina um modo automático de
comportamento. Fornece a um grupo da mesma espécie uma base comum de ação,
geneticamente assegurada.
O caráter coletivo do
comportamento inspirado pelo instinto garante a ordem dentro de um bando. Cada
novo membro já nasce trazendo impresso em seu cérebro o conhecimento necessário
à sua sobrevivência e à da espécie, em geral. Não necessita de longo
aprendizado. Não se defronta com os problemas ligados à necessidade de ter que
escolher. Numa sociedade dominada por processos instintivos, as escolhas são
poucas.
O instinto tem a vantagem de oferecer uma base de relações sociais segura
e confiável. Traz em seu bojo, porém, uma grande desvantagem: por ser rígido e
voltado numa única direção, torna praticamente impossível a mudança de comportamento
que uma situação nova e inesperada vier, porventura, a exigir. O instinto faz
de certos animais prisioneiros de um determinado habitat. O mesmo vale para um
agrupamento humano de nível análogo.
O excesso de segurança e
de ordem gera como contrapartida a falta de flexibilidade e a incapacidade de
acompanhar o ritmo do tempo histórico, quando este se acelera. A história não é
um trem que fica à espera dos retardatários. A Evolução tem pressa. Isto vale
de modo todo particular para épocas que precedem às grandes transformações. Nós
vivemos numa dessas épocas. Não nos defrontamos apenas com os estragos causados
por uma civilização escancaradamente voraz e predatória. Estes só por si são
mais que suficientes para impor à humanidade um novo tipo de consciência e um
modo radicalmente diferente de se relacionar com a natureza.
O despertar de uma
consciência ecológica, embora necessário e urgente, representa apenas um dos
aspectos parciais de um despertar mais amplo. Estamos todos inseridos num movimento
global de conscientização progressiva. Deus sabe quanto e quão maravilhosos
mundos estão à nossa espera. O flagelo que maltrata mais o pensamento
científico e filosófico ocidental é sua pequenez. A grandeza do mistério
amedronta nossos pensadores tanto quanto o caráter aparentemente contraditório
da realidade.
In: Manuscrito de Pe.
José Marcos Bach, sj.
FALTA CONSCIÊNCIA ECOLÓGICA
Rochas, mares, plantas, animais e o próprio homem moram
juntos na mesma casa. Plantas e animais tomam o cuidado de manter limpa a parte
da casa que ocupam. Só o homem ainda não atingiu o mesmo grau de consciência
ecológica. Sua capacidade de criar poluição é inesgotável. Poluição
atmosférica, poluição hídrica, poluição sonora, poluição emocional, poluição
moral: são algumas das áreas mais contaminadas.
A carga de
efluentes tóxicos que nossos parques industriais despejam diariamente na
atmosfera e nos oceanos é de tirar o sono a qualquer político ou técnico sério.
Comparada, no entanto, com a carga de ódio e de indiferença social e moral que
é produzido diariamente em nossas usinas políticas, o futuro da biosfera corre
riscos bem menores do que os que ameaçam o tecido infinitamente mais delicado
da noosfera.
A qualidade
dos pensamentos e sua correspondente carga emocional colocada em circulação
pelos Meios de Comunicação poderiam transformar este planeta num paraíso.
Bastava para isso que fossem positivos, inspirados num sim incondicional à Vida
em todas as suas formas e dimensões.
“Vim para
que todos tenham vida e a possuam em plenitude” (Jo 10,10).
Hoje uma nuvem pestilenta feita de ódios, de rancores, de
invejas e de desrespeito à Vida circula e se expande livremente por sobre a
face da terra, alimentada constantemente por rios de dinheiro e de mentiras. É
mais fácil hoje encontrar quem se disponha a matar do que alguém disposto a dar
a sua vida por amor a seu semelhante.
É preciso
ter em vista o caráter evolutivo do processo pelo qual a vida é transmitida de
geração em geração. A nova planta não é exatamente a reprodução mecânica da que
lhe deu a origem. É próprio da Vida produzir mudanças capazes de melhorar as
condições gerais da biosfera. Melhor em nosso caso é toda mudança que favorece
a integração e desfavorece a competição. Quando estas mudanças deixam de
ocorrer, a espécie toda inicia o longo caminho do descenso rumo à extinção. São
incontáveis as espécies biológicas e as civilizações que tiveram este destino.
A razão é sempre a mesma: quem não quer mudar perde o direito a um lugar no
Banquete da Vida!
Uma instituição humana, religiosa ou não, perde o contato
com a Vida e com o Futuro na medida em que substitui a imaginação pela memória.
Quando a Tradição começa a ter mais peso do que a imaginação criativa, estamos
diante de um dos mais evidentes sinais de decadência.
No terreno religioso e moral é exatamente isso que está
acontecendo por toda a parte. O que deveria estar acontecendo é o contrário.
Uma empolgante e poderosa antevisão do futuro deveria ocupar o seu lugar.
O futuro não
é apenas nem primordialmente continuação do tempo histórico passado ou
presente, mas inauguração de um Novo Tempo e de um novo modo de fazer história.
Consistirá em fazer acontecer o que ainda não aconteceu. E isto por meios que a
humanidade até hoje não teve a ousadia de empregar. Onde o Amor será a energia
propulsora da história. E a Liberdade o caminho.
In:
Manuscrito de Pe. José Marcos Bach, sj
A ECOLOGIA NA HISTÓRIA DA HUMANIDADE
A História da humanidade é um Todo. Os diversos eventos que
a compõem fazem parte de um Único Projeto Global. Cada acontecimento só pode
ser compreendido quando se toma em consideração sua relação com este Todo. Só uma
visão holístico-sintética é capaz de nos proporcionar uma compreensão mais
justa e correta do curso da história.
Os fatos que compõem a História, tanto a da biosfera quanto
a da noosfera humana, não surgem de forma alienatória, mas fazem parte de uma Intenção,
de uma Vontade Superior.
A natureza pode parecer caprichosa, mas na realidade, se
capricho existe, é o de fazer tudo da melhor forma possível. E o melhor é
sempre o mais útil e o mais perfeito. Darwin ainda definiu a natureza como uma
espécie de campo de batalha e a vida como forma de luta, a luta pela vida, onde
a vitória sempre cabe ao mais forte e/ou ao mais esperto, ao que sabe
aproveitar melhor as vantagens e as oportunidades que se lhe apresentam.
Hoje já não se encontra mais biólogo que se disponha a
fazer-lhe coro. A natureza se serve da competição, é verdade, mas não é seu
recurso preferido. O método predileto da natureza é a cooperação. A palavra
ecologia traduz melhor a visão que da natureza tem a ciência moderna.
Milhões de espécies biológicas se comportam como se fossem
membros da mesma família. A ovelha come o capim, mas não o arranca. O lobo come
ovelhas, mas só aquelas que se isolam do rebanho. A natureza é sábia, dizem os
entendidos. Ela é sábia porque é obra de um Criador sábio. Não fosse o Sol e a
Lua, a Terra não seria mais que rochas escuras a flutuar no espaço.
A natureza é
fiel ao seu Criador, mas esta fidelidade não consiste em repetir sempre o
mesmo. A Biodiversidade é a prova de que ela é alérgica à repetição monótona do
mesmo perfil. Se o Criador não tivesse injetado em sua obra este pendor para o
diferente, o universo não seria o que é.
Durante
milênios a humanidade teimou em combater a diversificação como inimiga da
unidade. A autêntica unidade cresce na medida em que o Todo pode expandir-se e
desdobrar-se em partes diversificadas. A unidade que nasce da uniformidade é
apenas aparente. A natureza não teme a diversificação. Aqui está a Amazônia
para nos ensinar esta lição maravilhosa: “o uno se manifesta no múltiplo”.
Um mundo perfeitamente uniforme nada mais seria que uma
coleção de fragmentos. Fragmento é toda a parte que não tem mais ligação com
seus pares e com o Todo.
Cometas, asteroides e meteoros são fragmentos de estrelas
mortas. Nada nos oferecem além do risco de uma colisão catastrófica. A ordem
reinante na biosfera se baseia fundamentalmente no princípio da solidariedade “inter pares” que na biologia moderna
recebeu o nome de Ecologia, palavra que vem do grego oikos (= casa) e logos (=
estudo).
In:
Manuscrito de Pe. José Marcos Bach, sj
LOUCURA ANTIECOLÓGICA
A ecologia é um ramo das ciências
naturais que só em data muito recente começou a merecer a atenção do mundo
científico. Muito pouco é o que sabemos a respeito dos ecossistemas e do modo
como interagem entre si. Neste campo, como em todos os outros, o montante de
perguntas e desafios é muitíssimo maior do que a quantidade de respostas
disponíveis. Há quantos séculos a humanidade confia cegamente na capacidade de
autorregneração da natureza. Porque a atmosfera tem cem quilômetros de
espessura, achou-se que ela poderia absorver qualquer quantidade de gazes
tóxicos. O tamanho dos oceanos era um convite aos canalizadores de cloacas. O
planeta Terra parecia tão grande que era impossível pôr em risco a sua
estabilidade. “Durante a noite a natureza recompõe o que o homem desequilibrou
durante o dia”! Era assim que se pensava até o momento em que as estatísticas
demonstraram que, para refazer o que o homem destrói num dia, seriam
necessárias muitíssimo mais “noites” do que uma só.
A Terra é um
planeta modesto, proporcionalmente pequeno e de recursos limitados. A maior
parte destes não é renovável. Sob vários aspectos a Terra é uma “mina” à beira
do esgotamento. A biosfera do nosso planeta se encontra toda ela concentrada em
torno de sua superfície. É uma camada cuja espessura não vai além de alguns
poucos metros. A imensa variedade de formas cria a ilusão de que a biosfera é
praticamente indestrutível. A precariedade da camada viva do planeta só começou
a ser percebida tardiamente. Só depois de constatar que parte considerável da
saúde ecológica do planeta está irremediavelmente comprometida é que se pensa
em fazer alguma coisa para impedir que a situação se agrave ainda mais. Ninguém
se dá conta de que um processo deletério tende sempre a se agravar. Tanto o bem
quanto o mal tem a propensão de se difundir. A deterioração do ambiente natural
é um processo que se move com energia própria. Também nesta matéria vale o
princípio ético segundo o qual “o que é ruim tende a fica pior”. Atingido certo
nível crítico, o processo torna-se irreversível. Existem suspeitas fundadas de
que em algumas áreas este ponto crítico já foi atingido.
In: “Ética e
Ecologia” – Livro de Pe. José Marcos Bach, sj. – Edição própria.
DE MÃOS DADAS COM A NATUREZA
A impressão que a natureza nos dá é a de um conjunto
determinado pelo preceito da “ordem”. Ordem entendida no sentido estático de
coisa feita para durar, sem possibilidade de alterar a natureza e a estrutura
das relações existentes. A verdade é que se este fosse o comportamento da
natureza não haveria lugar para o surgimento de novas espécies biológicas, nem
o homem teria como abrir espaço à sua investida cultural. Entre as muitas
constatações que os físicos modernos fizeram está a de que os ecossistemas da
natureza estão mais próximos do caos
do que do estado que definimos como ordem.
O comportamento natural é menos previsível do que se supunha. Não está comprovado que a mesma causa acabe produzindo sempre os mesmos efeitos. A mesma experiência, rigorosamente idêntica às anteriores, pode produzir efeitos diferentes. A lei de causa e efeito não é tão inexorável como se supunha. A mesma causa pode produzir mais que um efeito só.
O comportamento natural é menos previsível do que se supunha. Não está comprovado que a mesma causa acabe produzindo sempre os mesmos efeitos. A mesma experiência, rigorosamente idêntica às anteriores, pode produzir efeitos diferentes. A lei de causa e efeito não é tão inexorável como se supunha. A mesma causa pode produzir mais que um efeito só.
Existe entre a natureza e a consciência do homem uma
afinidade ontológica. O ser humano é matéria de um extremo ao outro. É, ao
mesmo tempo, espírito de ponta a ponta. Foi um erro metafísico atribuir-lhe uma
dupla natureza, a material e a espiritual. O
homem é por essência um ser em que espírito e matéria encontraram a mais
inteligente forma de convívio.
Só uma sociedade competitiva como a nossa
consegue ignorar o princípio de acordo com o qual o que determina a ordem não é
a “lei da fidelidade”, mas o espaço reservado à opção criativa. Tudo indica que
a natureza está muito menos amarrada ao passado do que certas instituições
sociais, criadas pelo homem. Todos os autocratas invocam a natureza como
avalista de suas pretensões monárquicas. A natureza, ao que tudo indica, tende
a fazer do convívio solidário o indicador de ordem por excelência. Parece que a
natureza tende a construir um ambiente em que todos se deem bem com todos.
In: “Ética e Ecologia” – Livro de Pe. José Marcos Bach, sj –
Edição própria.
O PORQUÊ DO DILÚVIO
A do Continente de Mu e a da Atlântida com certeza não
foram as primeiras e nem serão as últimas Civilizações a desaparecerem da face
da Terra. Os Hopi, uma pequena tribo de Índios americanos, afirma que já
ocorreram três “Dilúvios” antes daquele que pôs fim a uma era de esplendor,
arrastando para o fundo do oceano a obra de dois povos orgulhosos!
O que já aconteceu uma ou até mais vezes, pode acontecer de
novo. Já que nosso poder de autodestruição nos permite pôr fim a toda Vida sobre
a Terra, não uma, mas três vezes, pois o estoque de armas atômicas armazenadas em
silos nos permitiria fazê-lo. É oportuno perguntar: “Podemos fazê-lo
impunemente? Somos os donos exclusivos do Planeta Terra? Somos os únicos seres
inteligentes do universo?”. A crença de que estamos sós no universo torna-se
simplesmente ridícula quando se toma em consideração a extensão que os
astrônomos atribuem ao nosso universo. Este espaço sem fim mensurável, que se
estende por distâncias que só podem ser medidas em anos-luz, seria o habitat de uma única espécie
inteligente? Não dá para acreditar! A crença-convicção de que temos todos, cada
qual por sua vez, que prestar contas não só do que fizemos, mas também do que
deixamos de fazer, impõe-se por si mesma.
Numa época tão repleta de desafios e de oportunidades
maravilhosas como a nossa, os piores pecados são os de omissão. Quando os
habitantes do Continente de Mu se refugiaram em seus templos à procura de
proteção, gritando: “Ramu, salva-nos”, a resposta que ouviram da parte de Ramu
foi esta: “Não havíeis previsto isso? Vós todos, ireis morrer com vossos servos
e vossas riquezas, e de vossas cinzas surgirão novas nações. E se elas se
esquecerem que são superiores, não por causa de seus trajes, mas por causa do
que fazem, a mesma sorte lhes será reservada” (O Continente Perdido de Mu –
Churchward, p.54).
Acerca das causas que provocaram o cataclismo mencionado na
Bíblia com a denominação de “Dilúvio”, existem duas versões: uma atribui o
fenômeno ocorrido na Antártida. Um imenso bloco de gelo teria se desprendido e
começado a deslizar em direção ao oceano. Os Anunnaki, que mantinham no extremo
sul da África um observatório metereológico, foram advertidos do perigo que
ameaçava suas minas de ouro no ABZU, como suas instalações no Golfo Pérsico.
Mas tomaram a decisão de ocultar a informação, não permitindo que ela chegasse
ao conhecimento dos filhos dos homens. Viram na catástrofe iminente uma
oportunidade de se livrar da incômoda presença dos “filhos dos homens”!
A teoria mais comumente aceita atribui a causa do dilúvio à
colisão de um grande asteroide com o planeta Terra. A possibilidade de
deslocá-lo em rota de colisão com o nosso planeta não exige poderes
sobrenaturais. Para quem possui os conhecimentos científicos e técnicos
requeridos, a empreitada deve ser até fácil.
Duas certezas envolvem a catástrofe que culminou com a
submersão de dois continentes e a destruição total de duas civilizações: os
deuses souberam com antecedência de anos, pois um barco com o tamanho da “Arca
de Noé” não se constrói em questão de meses, nem é possível fazê-lo tão às
escondidas que ninguém do vigilante serviço secreto dos deuses tivesse sido
capaz de descobrir o que estava sendo tramado com o fito de frustrar, ao menos
parcialmente, o plano dos deuses. Que o dilúvio foi um cataclismo provocado
intencionalmente por inimigos da humanidade é algo que a Bíblia admite sem
reticências. O capítulo VI do Gênesis fala da perversão da raça humana. O
pecado mortal de que a humanidade se tornara culpada única e exclusiva era a
quantidade crescente de casamentos mistos, unindo filhos dos deuses com filhas
dos homens.
O motivo determinante da ira dos deuses e da sua
determinação de permitir a extinção da espécie humana é o mesmo que levou a
Alemanha Nazista a promover o extermínio de milhões de judeus e ciganos: o zelo
pela pureza racial.
In: “Do ‘Bom
Selvagem’ ao ‘Homem Noético’” – Artigo de Pe. José Marcos Bach, SJ – No Blog www.padrejosemarcosbach.blogspot.com.br em ARQUIVOS DIVERSOS.
O SER HUMANO NO MESMO NICHO ECOLÓGICO
Pouco tempo atrás ainda se tinha o espaço interestelar como
vazio. Hoje se sabe que o vácuo é na realidade um “plenum”, densamente carregado de energia.
No campo da astrofísica as surpresas crescem na mesma proporção
em que teorias novas tomam o lugar de outras. Em questão de um século a velha
maneira de fazer ciência tornou-se totalmente obsoleta. É este um fato do qual
só poucos cientistas tomaram conhecimento. A maioria deles, “cacareja” para o
lado de Einstein, mas “põe o ovo” no lado de Newton e Descartes.
Quando em 1859 o inglês Charles Darwin publicou seu livro
“A Origem das Espécies”, abalou, sem querer, os alicerces da fé religiosa na
“criação” do homem. Até aquela data a Bíblia era a única fonte de informação a
respeito da origem do homem. A interpretação criacionista imperava soberana não
só nas igrejas, mas também nas universidades. A Bíblia dizia que Deus criara o
“homem à sua imagem e semelhança”. Por ser imagem de Deus, o homem saiu da
mente do Criador dotado com o máximo de perfeição, além da qual não é possível
avançar. Consequentemente não podia haver no processo de hominização espaço
para o que posteriormente veio a ser considerado como evolução. A ideia de que
em seus primórdios a humanidade era composta de indivíduos que pouco se
distinguiam dos demais primatas como o chimpanzé e o gorila, ainda hoje geram
protestos indignados da parte de criacionistas irredutíveis.
É um erro
afirmar que o homem descende do macaco. O homem, mesmo o representante mais
primitivo de nossa espécie, nunca foi macaco. Só quem entende mal o processo
evolutivo que desencadeou o processo de hominização pode definir o homem como
uma espécie de primata mais inteligente que os demais. A passagem que ensejou o
aparecimento do gênero Homo não foi
gradual. É a um “salto qualitativo” que devemos a origem da nossa espécie. O
homem não pode ser definido como um animal que escapou do Zoológico.
Aristóteles, ao definir o homem como “animal racional”, não
teve a intenção de reduzir o homem, equiparando a sua animalidade a de um
primata, por exemplo. O que quis dizer foi isto: o homem continua sendo um
“animal”, o mais evoluído de todos, mas a sua animalidade não é mais a mesma
dos demais membros da biosfera.
O homem pertence ao mesmo nicho ecológico que os demais
membros do universo em que vive. Francisco de Assis chamou o sol de “irmão” e a
lua de “irmã’. O lobo é para ele o “irmão lobo”. A consciência de pertencer a
uma grande família universal faz parte dos aspectos essenciais de uma bem
evoluída consciência cristã.
A arte milenar de cultivar a terra e de servir-se dos
recursos da natureza com a consciência de que há um limite além do qual não é
permitido ir, cedeu lugar, em grande parte do mundo, a um modo extremamente
predatório de tirar proveito da exuberante generosidade da Mãe Natureza. A
agricultura deixou de ser uma arte e fonte de vida para tornar-se um negócio, o
agronegócio. Criamos frangos, bois e porcos aos milhões para exportar a carne.
O negócio não está mais em produzir para consumir, mas em produzir para
exportar!
In: “À luz
da Ciência” – Manuscrito de Pe. José Marcos Bach, sj
A CAUSA DO DILÚVIO
A causa
natural do desastre é atribuída por alguns ao deslocamento de um enorme bloco
de gelo que se teria desprendido de uma geleira da Antártica, deslizado
lentamente em direção do mar, e, ao cair no oceano, teria provocado um “tsunami”, um maremoto de proporções
catastróficas!
Uma outra
versão diz que a destruição toda foi causada pelo impacto de um grande
asteroide com o nosso planeta. Este impacto teria provocado, além de uma
intensíssima atividade vulcânica, o deslocamento do eixo da Terra, alterando as
condições climáticas gerais de muitas regiões do planeta. O pólo norte
magnético se encontra, desde então, a uma distância de três mil (3.000)
quilômetros do lugar onde se encontrava antes. Há indícios de que o lugar do
impacto foi a costa do Continente Norte-Americano, mais precisamente a região
das Ilhas Bermudas.
Seja qual
for a causa, certo é que a humanidade se viu do dia para a noite obrigada a
recomeçar tudo de novo. Dois mil anos foram necessários até que o norte da Europa
ficasse livre do gelo que a cobria até então; até que o Egito e a Mesopotâmia
pudessem ser repovoados por habitantes das Montanhas da Ásia Central. A
reconstrução das cidades destruídas e dos campos foi tarefa confiada a Ninurta,
filho de Enlil. Mudaram radicalmente de opinião, e até mesmo os representantes
da ala “antrofóbica” convenceu-os de que sem a colaboração dos filhos dos
homens a presença dos filhos dos deuses na Terra seria impossível.
A Bíblia
descreve no capítulo 9 do Gênesis a mudança política em curso: “Deus disse a
Noé e a seus filhos: da minha parte vou estabelecer minha aliança convosco e
com vossa descendência” (Gn 9,8-9). “Este será o sinal da aliança: ponho o meu
arco nas nuvens como sinal da minha aliança com a Terra” (Gn 9,12-13).
A Terra já
não podia ser mais vista como propriedade e feudo exclusivo de invasores
estranhos. Os deuses decidiram repartir e compartilhar o domínio do planeta com
os que nele tinham nascido.
Por que os
judeus tomam o ano de 3.760
a .C. como o ano inicial do seu calendário? Foi este o
ano em que os sumérios lançaram o Calendário de Nippur. Foi o ano em que Anu, o
supremo soberano de Nibiru, aproveitou a passagem do seu planeta tão próximo da
Terra para honrar seus súditos terráqueos com uma “Visita Oficial”. Aproveitou
a ocasião para estreitar os laços de cooperação com os habitantes da Terra,
instituindo o Sacerdócio e a Realiza, encarregando os filhos dos homens de
exercê-los.
O rei tinha
por obrigação providenciar para que na mesa dos deuses nunca faltasse a carne
gorda de vitelos que eles tanto apreciavam. Cabia-lhes também a tarefa de manter
o povo submisso à autoridade dos deuses.
Ao sacerdote
cabia a tarefa de providenciar para que o culto prestado a um deus estivesse à
altura da dignidade ao respectivo deus.
O poder dos
representantes destas duas instituições representou fator decisivo na arena
política durante milênios. Só agora elas estão sofrendo perda de prestígio. É
raro encontrar um rei que ainda disponha de algum poder. Judeus, muçulmanos,
hinduístas, budistas e protestantes não têm sacerdotes. Até o Sumo Pontífice da
Igreja católica já é uma figura decorativa, pois a cada passo perde um pouco do
prestígio que ainda possuía menos de cem anos atrás.
In: Artigo
de Pe. José Marcos Bach, SJ – “Do ‘Bom Selvagem’ ao ‘Homem Noético’” no Blog www.padrejosemarcosbach.blogspot.com.br – ARQUIVOS DIVERSOS.
O HOMEM E SEU PLANETA
A
humanidade atual possui um nível de consciência por demais primitivo e
rudimentar para merecer o título de sapiens.
Tem toda a razão os que acusam o homem civilizado de hoje de ser incapaz de
conviver pacificamente com seus semelhantes e em harmonia com a natureza por
priorizar o espírito de competição em detrimento do espírito de solidariedade.
Está sendo motivo de crescente queixa o modo desastrado como tratamos a Mãe
Natureza. A biosfera é uma grande mesa em torno da qual estão sentados milhões
de outros seres vivos de cuja vida dependemos muito mais que da sua carne. É
absurdamente falsa a crença de que a vida deles é diferente da nossa, e que
podemos desligar o destino da humanidade do destino da biosfera.
O homem
e seu planeta estão submetidos a um destino comum. Maltratando a Mãe Terra, o
homem maltrata a si mesmo. A extinção de uma espécie biológica não é uma
fatalidade, é sempre o fruto de um pecado pelo qual a humanidade toda é
responsável. “A natureza toda geme à espera de ser libertada pelo homem” (Rm
8,21). Antigamente, a atividade agrícola fazia parte da consciência religiosa
de uma pessoa, tanto na China como na Europa. Hoje, o seu lugar foi ocupado
pelo agronegócio. Engana-se redondamente quem vê em tudo isso um sinal de
progresso. A mercantilização da atividade agrícola representa um retrocesso
cultural de graves proporções, pois o que pode ser comprado e vendido não pode
constar na lista dos valores significativos e inalienáveis da vida humana. O
crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) só pode ser identificado como sinal
de progresso por quem já perdeu de vista a dignidade da pessoa humana.
Houve
época em que se acreditava que mudando as estruturas sociais este fato iria
contribuir decisivamente para transformar as pessoas. A crença de que
estruturas sociais mais justas iriam produzir, ipso facto, governantes e cidadãos mais justos naufragou
solenemente. No período final de sua vida o próprio Marx ficou decepcionado com
o que escrevera. Tivesse tido mais tempo para fazê-lo, teria re-escrito tudo de
novo.
Em que
aspectos fundamentais é preciso corrigir e completar o pensamento social de
Marx? Um dos erros de Marx consistiu em definir o relacionamento social humano
em termos de serviço. Atribuindo ao binômio senhor-servo um caráter paradigmático, acabou navegando nas mesmas
águas que seus colegas do mundo capitalista. Não é por acaso que sua obra
principal passou à história com o título de “O Capital”.
Também
no mundo socialista o capital possui direitos e privilégios a que o trabalho se
deve submeter. Na briga entre o capital e o trabalho, “quem paga o pato” é o
trabalhador.
Pe.
José Marcos Bach, SJ
MATÉRIA E ESPÍRITO NÃO SE OPÕEM
O Oriente tem muito a nos ensinar a nós, ocidentais e
cristãos. Mas a última palavra e o texto final terão que ser redigidos no
Ocidente. Teilhard de Chardin é cristão, mas é um pensador religioso mais
afinado com o pensamento de um Sri Aurobindo do que com as elucubrações
teológicas de um Santo Tomás de Aquino. A razão, da qual este santo doutor da
Igreja tanto esperava, nos deu de presente a Bomba Atômica e tantas outras
“bombas” de efeito retardado. Uma das características do pensamento oriental
como do pensamento Teilhardiano é que ele não é nem técnico nem utilitarista.
Ele é essencialmente pragmático, no melhor sentido da palavra.
Nem Teilhard nem Sri Aurobindo são teóricos no sentido que
Marx o foi. Marx determinou o que outros deviam fazer. Ele mesmo não se atreveu
a morrer pela causa que defendia. Quem não se arrisca a dar a vida por suas
ideias não merece fé. Cristo pagou com a vida o fato de se colocar em oposição
frontal com os líderes religiosos do seu povo. Teilhard de Chardin pagou com o
exílio e o ostracismo o fato de permanecer fiel às suas convicções. Foi um
Guilherme Tell, a seu modo. Abraçou os seus adversários em vez de destruí-los.
Assim como Cristo abraçou do alto da cruz os seus carrascos e perseguidores.
Não existe no pensamento de Teilhard oposição entre
progresso material e desenvolvimento espiritual. Ambos fazem parte de uma
corrente evolutiva convergente. São movimentos que se interpenetram e se
reforçam reciprocamente. Há na visão de Teilhard um lugar e um papel para o
materialismo desde que se o depure de sua conotação marxista, por exemplo. O
pensamento cristão, quando expurgado de seus traços pesudo-espiritualistas,
inclui a realidade material entre os valores essenciais da Ordem da Salvação. Também o corpo, com tudo o que
encarna e sintetiza, é dom e graça de Deus, tanto quanto o espírito do homem.
Marx achincalhou a dimensão espiritual do homem, quando
reduziu o “espírito” à condição de epifenômeno, algo semelhante a uma verruga
no rosto de alguém. Deixou-se arrastar pelo sentimento de revolta contra a
tirania de um movimento “espiritualista” extremado e alienador. Incidiu no
mesmo erro fundamental de seus adversários: manteve a separação entre Espírito
e Matéria.
O grande mérito de Teilhard está em
ter percebido a falsidade do dilema: ou espírito ou matéria. Para ele graça e
natureza, o bem e o mal só existem como entidades separadas na mente do homem.
São categorias, mas não são realidades ontológicas. Vivemos num mundo em que
todos estes opostos só existem como tais na limitadíssima percepção do homem
ocidental. O trigo e o joio crescem junto e se alimentam da mesma seiva. Tanto
se parecem que é quase impossível distinguir um do outro. Quem se propõe
erradicar o joio em proveito do trigo expõe-se ao risco de provocar mais
estragos do que benefícios. É preciso aprender a tolerar a lentidão do ritmo
evolutivo. Quem quer aprender a julgar uma árvore a partir dos frutos que é destinada
a produzir, deve esperar que amadureçam.
In “Ética e Ecologia” de Pe. Marcos Bach, SJ – Ed. Própria.
ESPÍRITO E MATÉRIA: UM TODO
O homem primitivo vive dominado pela consciência de sua
subordinação à natureza. O homem civilizado se considera senhor da natureza e
dono da Terra. Mas há uma postura bem mais sensata e que os povos civilizados
do Oriente há milênios estão adotando. Não desenvolveram tecnologias capazes de
prejudicar o equilíbrio ecológico nem se submeteram cegamente às forças da
natureza. Criaram civilizações em que a característica principal era a
integração do Homem no Meio Ambiente. Havia nelas algo parecido com um “casamento
indissolúvel” entre espírito e matéria. O universo era visto mais como
totalidade do que como soma de fragmentos. Viam a natureza mais como fonte de
energias do que como reserva de matérias primas. Levaram, talvez, milênios para
aprender o que nós, ocidentais, ainda estamos por aprender: a existência de um
movimento evolutivo convergente entre o Espírito do Homem e o Espírito da
Terra.
Os orientais não perderam tempo nesta luta inglória entre
matéria e espírito, entre natural e sobrenatural, entre o sagrado contra o
profano. Creio que do ponto de vista histórico-evolutivo o Oriente leva sobre o
Ocidente a vantagem de ter permanecido mais fiel e mais próximo da verdade
essencial do que este último. A verdade essencial é a “união com o seu Criador
através da Natureza”. O que transforma o pensamento religioso ocidental em
fonte de alienação de todo o tipo é a proclamação do “divórcio” entre Espírito
e Matéria, entre o natural e o sobrenatural, entre o tempo e a eternidade,
entre o bem e o mal e assim por diante. Nós, ocidentais, criamos opostos que se
excluem. O pensamento oriental, mais afeito à noção de convergência, criou um
espaço cultural mais propício à formação de sínteses novas e originais.
Nós ocidentais nos proclamamos superiores aos outros em tudo.
Partimos da premissa teológica de que o cristianismo representa a última e
definitiva manifestação da verdade e da vontade de Deus. O que equivale a
sustentar que as Igrejas cristãs representam a última fronteira entre as
potencialidades do amor divino e as necessidades espirituais da humanidade.
Para não incorrer no erro de trocar as mãos pelos pés é preciso não esquecer
que existe uma diferença radical entre o cristianismo politizado das Igrejas e
dos eclesiásticos e o cristianismo fiel às raízes evangélico-eclesiais.
In
Ética e Ecologia de Pe. J. Marcos Bach, SJ.
ATITUDE DIANTE DA NATUREZA
As graves perturbações do
equilíbrio ecológico provocadas por um processo de industrialização desenfreado
e irracional serviram para abalar o prestígio do homem como senhor da natureza.
Foi um erro metafísico investir o homem na função de proprietário dos recursos
do nosso planeta. O conceito de propriedade aplicado à natureza em relação ao
homem representa um absurdo metafísico, porque não passa de uma projeção
feudal-capitalista. A Terra é um organismo vivo. Não se pode, portanto, mexer
nela sem consultá-la antes. Aqueles povos que consideram os espíritos dos
bosques, os espíritos das águas, dos ventos e das montanhas os verdadeiros
donos da natureza, não o fazem por serem menos evoluídos que nós. Chegaram a
esta crença porque viviam muito mais identificados com a vida e a natureza em
geral do que nós. Seria maravilhoso se também nós viéssemos a convencer-nos de
que existem, por toda parte, seres invisíveis encarregados de zelar pelas
diversas formas de vida, a começar pelo homem. À solicitude destes verdadeiros
Anjos da Guarda da biosfera devemos o fato do planeta Terra ter-se tornado um
lugar habitável. Ao utilitarismo brutal e ao materialismo
obtuso dos últimos séculos é que devemos a situação calamitosa de hoje.
Caso não formos capazes de
substituir a mentalidade pragmático-utilitarista por uma atitude
ético-religiosa de respeito e solidariedade, não vamos reverter a atual
situação de queda livre em direção ao desastre. Ética é, em primeiro lugar, responsabilidade e respeito pelos limites, pelas regras estabelecidas, pelos
sistemas que asseguram a estabilidade e o equilíbrio de um Todo organizado. Já
que a natureza é um organismo vivo submetido à lei do crescimento, o respeito
por suas leis é imprescindível. Respeitar estas leis e associar-se a elas é uma
coisa, e submeter-se a elas, é outra, bem diferente. O que se pretende é definir
os parâmetros de uma ética ecológica fundamentada não na submissão do homem à
natureza, mas no princípio da cooperação e solidariedade entre dois “sujeitos”
dotados de consciência e autonomia. O homem que quiser evoluir espiritualmente
deve aprender a ajustar-se às leis da natureza. Em contrapartida tem o direito
de ajustar a natureza às exigências superiores do seu crescimento espiritual. É
que a evolução da natureza está, d’ora em diante, íntima e indissoluvelmente
ligada à evolução espiritual do Homem.
Do livro “ÉTICA E
ECOLOGIA” de Pe. José Marcos Bach, SJ
O FUTURO ECOLÓGICO
A recuperação ecológica do nosso planeta exige mobilização
de recursos tão díspares quanto o financeiro e o ético-religioso.
A vontade
política, por si só, não produzirá nem a milésima parte dos resultados
necessários.
Político algum está
decidido a cortar despesas destinadas à defesa, por exemplo, para destiná-las à
luta contra a poluição ambiental.
Não há estrategista
que não associe segurança nacional com poderio econômico e militar. Todos continuam a resguardar a segurança de suas
fronteiras, transformando-as em barreiras de toda a espécie.
Quantos são os
líderes políticos que já se deram conta de que o inimigo mais perigoso mora
dentro das fronteiras de seu país?
Quem não percebeu que
a indústria automobilística é para os Estados Unidos uma bomba de efeito pior
que a soma de todas as ogivas nucleares reunidas do planeta? A razão elementar:
o potencial destrutivo destas está sob controle, ao passo que indústria como a
automobilística, assim como a química, zombam de eventuais tentativas de
controle.
A ameaça maior que
pesa hoje sobre cada povo deste planeta não é a que parte de fora, mas a que se
arma dentro das fronteiras do seu próprio país. A destruição acelerada das suas
matas e florestas expõe o povo brasileiro a um perigo muito maior que todas as
ameaças vindas de fora.
... estrategista de Segurança Nacional terá que deixar
de lado conceitos de natureza geopolítica, colocando em seu lugar uma visão em
que segurança deixa de ser uma questão nacional para tornar-se parte integrante
de uma visão de segurança essencialmente global.
O conserto dos estragos feitos ao meio ambiente natural tem
que começar pela cabeça das pessoas, pois todas elas, sem exceção, contribuíram
e continuam contribuindo para agravar sempre mais a crise ecológica. Isto
significa que só uma mudança radical no modo de pensar e de agir por parte da
humanidade toda poderá reverter a situação.
Do livro "Ética e Ecologia" de Pe. José Marcos Bach, SJ
Do livro "Ética e Ecologia" de Pe. José Marcos Bach, SJ
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