MUDANÇAS NAS ESTRUTURAS DO VATICANO
O novo Papa era um homem
que detestava receber aplausos e colher elogios. Dizia o que pensava, mas sabia
fazê-lo com tamanha simplicidade, humildade e modéstia que ninguém saía da sua
presença com a impressão desagradável de não ter sido compreendido ou de não
ter sido levado a sério. Uma hora de convívio com ele bastava para deixar a
impressão de que ele não era daqui e que viera de outro mundo.
Havia nesta impressão uma parcela de verdade, que só muito
lentamente começou a ser percebida pela opinião pública: a de que ele não tinha
a intenção de ser um simples sucessor de Pedro e continuador de um passado
repleto de tranqueiras canônicas.
A Igreja que tinha o
propósito de legar a seus sucessores não era aquela que herdara de seus
antecessores. Nunca o disse, mas todas as suas decisões davam a entender que
não iria contentar-se com soluções “cosméticas” e “cirurgias plásticas”
destinadas apenas a melhorar a imagem da Igreja e o prestígio da figura do
Papa. Quando a Cúria Romana, guarda-mor das chaves de Pedro, se deu conta da
nova realidade, já era tarde. O novo Papa aproveitara os primeiros meses do seu
governo para colher o máximo de informações a respeito do estado geral da
Igreja. Percebeu que havia grande necessidade de desobstruir os canais de
comunicação que punham o Papa em contato com a Igreja universal, que em muitos
casos dificultavam as coisas além dos limites do inevitável. Morosidade
burocrática e subterfúgios jurídicos eram para ele vícios com que não pretendia
pactuar.
Com o fito de aligeirar
os trâmites burocráticos começou a despachar fora dos muros do Vaticano. Alugou
um prédio e montou nele o seu escritório. Lá se reunia com seus auxiliares mais
chegados, recrutados todos eles dentre o que as Ordens Religiosas tinham de
mais moderno a oferecer. Sendo ele mesmo um intelectual, o novo Papa, além de
detestar números e fórmulas prontas, amava trocar ideias. Fazia suas refeições
nas imediações do Escritório, pois tinha o hábito de aproveitá-las para
comunicar-se com seus auxiliares. Era lá, ao pé de um copo de vinho e de um
saboroso prato de “Spaghetti”, que
recebia em audiência visitantes ilustres. Poder almoçar com o Papa era uma
honra e uma distinção que só a poucos era concedida.
Os convidados eram quase
sempre cientistas, amigos da natureza. Pouco importava sua nacionalidade, credo
religioso ou filiação política. Ideólogos, assim como turistas, gente que ia a
Roma para ver o Papa, tinham pouca chance de ver satisfeito o seu desiderato. O
Papa abolira na prática o regime de audiências. Achou que era uma
injustificável perda de tempo, além de ser um resquício bolorento de uma era
que já não fazia mais parte de um mundo em que o telefone estava à mão de quem
quisesse comunicar-se.
A Comissão de Assessoramento
e Planejamento Pastoral que o Papa criara com o objetivo bem preciso de
livrar-se da lerda e pesada máquina administrativa que herdara de seus
antecessores, era composta de religiosos oriundos de mosteiros e conventos. A
maioria dos seus membros eram sacerdotes, mas havia entre eles também irmãos
leigos e até mesmo uma que outra freira podia ser vista nas reuniões. Ninguém,
envergando faixa vermelha ou ostentando título honorífico, fazia parte do Corpo
de Auxiliares diretos do Papa. Os Superiores das Ordens e Congregações que
tinham cedido ao Papa a colaboração que ele solicitara, tinham também assumido,
por sua conta, a manutenção financeira da Comissão. Com isto o Papa se viu livre da ingerência do IOR (Instituto das Obras
Religiosas), sustentado e controlado pelo “Opus
Dei” e congêneres.
Esta liberdade o novo
Papa sabia como aproveitá-la. Em lugar da velha e enferrujada ponte de ligação
do Papa com o Povo de Deus, construiu uma nova ponte por onde podia passar a
qualquer hora do dia ou da noite sem se ver barrado no caminho por um vigilante
Monsenhor da Cúria Romana.
In: “O NOVO PAPA” –
Manuscrito de Pe. José Marcos Bach, sj.
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