DA COSMOVISÃO À TEOLOGIA
Quando um mestre em teologia tenta localizar o seu mundo
religioso no plano do sobrenatural e do sagrado, está empregando um paradigma
que os melhores cientistas da atualidade já não usam mais. A visão que do mundo
tinham Agostinho, Tomás de Aquino, Newton e Descartes já não corresponde mais à
cosmovisão de um bom físico ou biólogo da atualidade. Tanto a concepção
dualista como a mecanicista não bastam para explicar o que se passa quando
átomos e elétrons interagem entre si. Tudo o que acontece no Universo está
inserido num movimento único, a que o físico David Bohm deu o nome de
Holomovimento. Tudo o que acontece afeta um Todo mais abrangente e complexo.
Em poucas palavras:
- O Universo não é o que durante séculos se pensava que
fosse.
- Um novo paradigma, um novo modo de fazer ciência, está
tomando o lugar do anterior.
- Este método novo não é tão novo quanto poderia parecer,
pois já foi usado milhares de anos antes pelos mais destacados pensadores do
antigo Oriente como Lao Tsé e Buda.
- A visão do Universo e da História, tal como no-la
descrevem homens de gênio como Einstein, Capra, Sheldrake, Prigogine, Teilhard
e Sri Aurobindo veio para ficar. Apoia-se em fatos. É realista na acepção mais
estrita do termo.
- Ela tem o mérito de permitir que se façam perguntas até
então tidas como irreverentes.
- É radicalmente antidogmática.
O dogma é o fruto dos que têm medo, medo do potencial
criativo e transformador que toda autêntica manifestação da verdade traz em seu
bojo. A verdade liberta, ao passo que o dogma estrangula a mente tanto a dos
seus criadores, quanto a dos pobres coitados que a ele se sujeitam. O dogma
empobrece a verdade que pretende servir. Pior do que isso: trai aspectos
essenciais da Verdade Total.
Hoje é difícil encontrar um cientista de projeção que não
seja humilde, que não reconheça as limitações do seu relacionamento
profissional com a realidade. O cientista metido a arauto de verdades
absolutas, se quiser ser levado a sério, terá que ir às praças onde é possível
encontrar pessoas que ainda necessitam de Verdades Absolutas.
No campo estritamente científico é praticamente impossível
topar com um Lisenko ou um Rosenberg. Todo sábio autêntico é humilde. Um
cientista torna-se sábio na medida em que toma consciência do tamanho da sua
ignorância. A verdadeira humildade, aquela que nasce da sabedoria, não consiste
em não saber, mas em ter consciência desta sua ignorância. Sábio de verdade é
aquele que aposta na parcela da Verdade Única que ainda não possui. Curiosidade
intelectual é isto.
Quem só investe naquilo e com o fruto do que já adquiriu,
morrerá pobre, tão miserável quanto o mais desamparado menino de rua.
O cientista moderno já não é mais aquele rato de
laboratório de antes. Não é mais aquele observador frio, imparcial e despido de
sentimentos. O físico David Bohm se confessa incapaz de permanecer neutro ou
imparcial. Todo avanço dado no terreno do conhecimento é também um ato de amor.
Dele participam tanto a pessoa que o realiza, quanto o Universo todo. Nada do
que acontece no Cosmos é indiferente. Ou é positivo ou negativo.
Se o Universo é o que dele pensam alguns dos cientistas
mais clarividentes da nossa época, então até o próprio mal pode ser reciclado e
transformado em “adubo” do bem. Carradas de razão tem a Bíblia quando diz que
após a conclusão da sua obra criadora, Deus “viu que tudo o que tinha feito era
bom” (Gn 1,31).
Jesus foi o homem menos imparcial de que se tem notícia.
Esteve sempre do lado das pessoas toda vez que entravam em conflito com
instituições encarregadas de moldar-lhes a consciência, em lugar de
respeitá-la.
In: Manuscrito de Pe. José Marcos Bach, sj