UM RETORNO ÀS CATACUMBAS
As catacumbas eram minas de pozzolana abandonadas. A pozzolana era uma argila, que, misturada
com cal e água, dava um material muito usado nas construções de alvenaria. Era
o equivalente do nosso moderno cimento. As galerias destas minas formavam uma
rede intrincada e complexa. Quem não a conhecesse, corria o perigo de não
encontrar mais o caminho da volta.
A catacumba era, portanto, um lugar
seguro, mas era preciso conhecê-la bem. E os cristãos a conheciam melhor que as
autoridades romanas. Os agentes do “Serviço Secreto” do Império sabiam da sua
existência, mas não se atreviam a penetrar em seu interior. Os cristãos, ao
contrário, conheciam muito bem como entrar e como sair dela sem se extraviar e
sem o risco de cair nas mãos dos agentes policiais romanos.
Uma catacumba é formada por
quilômetros de galerias estreitas que se cruzam e entrecruzam constantemente,
constituindo o conjunto de um refúgio ideal para quem necessita de segurança.
Uma das “ordens menores” da Igreja
católica tem o nome de “ostiariato”. O “ostiário” era a pessoa encarregada de
vigiar a entrada, o “ostium” de uma
catacumba para impedir que a Assembleia reunida em seu interior fosse atacada
de surpresa pela polícia romana.
A Comunidade Cristã só ocupava uma
pequena parte de uma catacumba, o espaço próximo à entrada, mas, em caso de
urgência, sabiam como sair pelos “fundos”. Havia mais que um modo de entrar
numa catacumba. E os cristãos os conheciam a todos.
Por
que esta familiaridade das Comunidades Cristãs com o ambiente de uma catacumba?
Porque o núcleo mais compacto e numeroso das Comunidades Cristãs da época era
composto de escravos e de membros da plebe romana. Eram todos, ou em sua
maioria, homens e mulheres que viviam à margem dos setores mais opulentos do
Império. Uma “mina abandonada” era o que mais se parecia com a sua condição
social.
Relembrando a palavra de Jesus: “O
Filho do Homem não tem onde repousar a cabeça” (Mt 8,20), um cristão obrigado a
procurar um espaço social fora de Roma e longe do “capitólio”, só podia
sentir-se à vontade no ambiente aparentemente “morto” de uma “catacumba”! A
Igreja das Catacumbas conseguiu sobreviver a duzentos anos de perseguição
porque seus líderes descobriram que o “cimento” que une os membros de uma
Comunidade Cristã não é o poder de uns poucos e a submissão passiva das
maiorias, mas o amor com que cada um dos seus membros ama os seus irmãos e suas
irmãs em Cristo.
Um
cristão que ia a uma catacumba para se encontrar com outros membros da sua
família espiritual sabia que podia confiar, sem pestanejar, em cada um dos que
ali se encontravam. Sem esta confiança a Igreja das Catacumbas não teria
conseguido sobreviver a 200 anos de perseguição!
A
confiança de cada membro de uma Comunidade Cristã nos demais membros desta
Comunidade é muito mais fundamental e imprescindível do que a presença de uma
autoridade forte. A Igreja das Catacumbas deve a sua sobrevivência ao amor fiel
com que seus membros se amavam uns aos outros. Um “informante” do “Serviço
Secreto” romano teria morrido de vergonha só com a ideia de entregar à
brutalidade de um carrasco uma só destas pessoas maravilhosas que o tinham
acolhido com tanto amor!
Voltar a nos encontrar novamente
reunidos no recinto de uma Catacumba não é essencial. Mas é absolutamente
imprescindível retornar ao “espírito” que animava os homens e as mulheres que
lá se reuniam! Uma Igreja, em que o que mais importa é confiar no “padre” ou
“pastor” do que no “vizinho” ajoelhado a seu lado, não merece a mesma confiança
e a mesma fé que um cristão depositava em sua Igreja , quando esta Igreja ainda era “pobre”,
fraca e marginalizada.
In “Se não vos converterdes...” –
manuscrito de Pe. José Marcos Bach, SJ.