CARACTERÍSTICAS DA IGREJA
PRIMITIVA
É falsa a crença de que Jesus, ao se despedir do
cenário histórico, tenha legado a seus discípulos um Projeto mal definido ou
até se tenha abstido de se preocupar com a continuação da obra por Ele
iniciada.
“Não vos deixarei órfãos, mas estarei convosco até a
consumação dos séculos” (Mt 28,20). Esta palavra de Jesus foi perdendo força e
credibilidade à medida que os apóstolos foram morrendo e seu lugar foi ocupado
por “representantes de Cristo na terra”.
“Enviar-vos-ei o meu Espírito e ele vos ensinará na
hora certa o que deveis de dizer” (Lc 12,12). Também esta palavra de Jesus
acabou se perdendo em “ouvidos de mercador”!
Os primeiros cristãos não se sentiam órfãos, nem se
comportavam como tais. Paulo se dizia apóstolo de Cristo, mas nunca se fez
passar por “representante de Cristo”. Paulo nunca se atribuiu outra
“autoridade” que aquela que lhe conferia a sua “incondicional fé em Cristo”. No
fim de sua sofrida existência, diz com orgulho: “Completei a carreira, guardei
a fé” (2Tm 4,7).
O Cristo que o apóstolo Paulo pregava não é um
Cristo ausente e distante da vida concreta dos membros de suas comunidades. É
um Cristo que se alegra com os que estão alegres e sofre com os que sofrem.
Um bom retrato da Igreja apostólica nos é fornecido
pelo livro Atos dos Apóstolos! São várias as características desta Igreja:
- Ela era doméstica, pois os seus membros se
reuniam em famílias. No início o Templo de Jerusalém e a Sinagoga eram
frequentados pelos cristãos, mas após a
destruição do Templo e a dispersão dos judeus, as comunidades cristãs passaram
a se distanciar cada vez mais da sinagoga e do judaísmo, adquirindo
personalidade religiosa própria. As “igrejas” fundadas pelo apóstolo Paulo eram
pronunciadamente domésticas e seus
líderes eram chefes de família. Uma nota distintiva desta “igreja” era a
posição destacada que nela ocupavam as mulheres. Lídia (Atos 16,14) e Priscila
(Atos 18,2) são mulheres, que devido à sua posição social, muito contribuíram
para a difusão da Fé Cristã. Ao traçar o perfil do bispo em sua carta a Tito,
Paulo descreve-o como “marido de uma só esposa” (Tito 1,6).
- Ela era
eminentemente “comunitária” e em certa medida até “democrática”. Dos seus
membros o povo dizia: “Vede como eles se amam!”. Quando o apóstolo Pedro tomou
a decisão de preencher o número dos “doze”, confiou à Comunidade a tarefa de
escolher o substituto de Judas, o Iscariotes.
- Outra característica das primeiras Comunidades
Cristãs era a crença na volta iminente
de Cristo para completar a sua obra e iniciar a instauração do Reino de
Deus. A “parusia”, isto é, o retorno de Cristo, era tido como iminente. Algo
que poderia acontecer ainda em vida dos mais jovens. Esta crença motivou muitos
“proprietários” de terras a vendê-las e a depositar o dinheiro, assim obtido,
nas mãos dos Apóstolos. Tudo o que os membros da Comunidade possuíam era
considerado “propriedade comum”! Este “comunismo” da Igreja Primitiva diferiu
num aspecto fundamental do “comunismo” de Karl Marx, pois nele o direito de
gerir os bens e de distribuí-los era exercido pela Comunidade, representada na
figura do “diácono”, em lugar de confiar esta função ao Estado, representado na
figura do “Comissário”!
- Na Igreja
Primitiva ainda não havia espaço para a figura do “sacerdote”. O apóstolo
Paulo se autodefine orgulhosamente como apóstolo de Cristo, mas não há uma
única passagem em suas cartas em que se defina como “sacerdote”!
A “missa”, como a conhecemos hoje, só foi inventada
mais tarde. Os fiéis se reuniam em “Assembleia” e a “Celebração Eucarística”
era definida como “Banquete”, como “Ceia”, pois era realizada no fim do dia. A
palavra “ágape” (= “banquete”) era empregada para definir o que se estava
realizando. A ideia de definir como “sacrifício” o que se estava fazendo, só
apareceu mais tarde! O “culto litúrgico” era visto, antes de tudo, como
repetição simbólica do que acontecera no Cenáculo em Jerusalém e que passou à
história com o nome de “Última Ceia”. Só bem mais tarde este gesto litúrgico
passou a ser interpretado como símbolo do “sacrifício de Cristo na cruz”!
A diferença entre a atmosfera que reina num banquete
e a que caracteriza a execução de uma sentença de morte é absoluta e total. Por
isso pode-se afirmar que os cristãos da Igreja Primitiva estavam mais próximos
da verdade e do pensamento de Jesus do que os atuais “rezadores de missa”.
Jesus não morreu na cruz na condição de “vítima” da
maldade humana. Entregou-se livre e espontaneamente nas mãos de seus inimigos e
algozes.
“Por isso o Pai me ama porque eu dou a minha vida e
novamente a reassumo! Ninguém m’a tira e eu a ofereço espontaneamente” (Jo
10,17). Mais que vítima da maldade humana Jesus foi “vítima” de seu imenso amor
pelos homens. É por isso que os primeiros cristãos foram mais sábios do que nossos
teólogos de hoje. Cristo encerrou em caráter definitivo a era dos “sacrifícios”
dando início a uma “Nova Era”! Ninguém tem mais o direito de tirar ou de
invadir a vida de alguém!
Do manuscrito “SE
NÃO VOS CONVERTERDES...” de Pe. José Marcos Bach, SJ
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