quinta-feira, 26 de junho de 2014

LIÇÕES DE VIDA QUE O ESPORTE OFERECE

O primeiro requisito logístico para uma boa partida de futebol diz respeito ao campo. Quanto mais técnico um time é, tanto mais exigente será em relação à qualidade do gramado em que vai pisar. Se fôssemos comparar os debates entre teólogos cristãos com o que entendemos como uma boa partida de futebol, teríamos que reconhecer que a quase totalidade dos entraves que costumam emperrar qualquer tentativa de aproximação é a má qualidade do campo. Depois vem a falta de respeito pelas regras básicas, sem as quais é impossível praticar esporte.

O bonito de uma competição esportiva está em que todos têm chances de vencer, ficando, porém, os melhores e mais competentes com as melhores chances.

Que outra coisa é a Encarnação do Verbo e tudo o que com ela se relaciona senão uma etapa a mais num projeto evolutivo mais amplo? Um novo capítulo do experimento homem.
           
Nós, cristãos, atribuímos a autoria do experimento homem, como da natureza em geral, a Deus, Senhor onisciente Todo-Poderoso do universo. Tudo o que com Teilhard de Chardin atribuímos à Evolução, atribuímo-lo também a Deus. A evolução nada mais é do que outro nome para a atividade criadora de Deus. Para um crente evolucionista Deus não se retirou do palco após o sexto dia da Criação. Pelo contrário. Não é do feitio do gênio Criador de Deus terminar a obra logo no primeiro dia. Quando a Bíblia diz: “E Deus viu que isso era bom” (Gn 1,12), não quer afirmar que tudo era perfeito, pronto e acabado. Logo, há espaço para crescimento, desenvolvimento, progresso e evolução ulterior. O que o pensamento evolucionista quer afirmar é o caráter dinâmico e progressivo da ação criadora de Deus.
           
Foi um erro metafísico separar o Criador da sua Obra. Distinguir não é separar sem mais. Se fosse possível separar o Ser de Deus do Ser de suas criaturas, estas desapareceriam sem deixar vestígio. Pois o Ser de todos os seres só pode ser o Ser Absoluto do qual são manifestações contingentes e limitadas. Foi o temor de incorrer na heresia panteísta que levou os pensadores cristãos a definir a relação entre o Criador e a Criatura em termos que beiram o nihilismo. Se Deus é tão Outro que suas criaturas nem mais se assemelham a Ele, então o universo só pode ser visto como um barco sem piloto e sem timoneiro. Se é verdade que o Criador continua descansando; se Jesus continua dormindo na barca de Pedro, então não admira que os homens não consigam entender-se nem sequer à beira da vala comum que os aguarda a todos, cristãos e pagãos.
           
A briga, envolvendo criacionistas e evolucionistas, é uma bela demonstração de incompetência teológica. Opor entre si Criação e Evolução é criar um dilema falso, pois tanto uma como a outra representam modos diferentes de ver a mesma coisa. São formas convergentes de análise dos dados da fé. Se existe oposição, ela é metodológica, apenas isso. É, pois, uma questão de método e como tal não envolve o conteúdo do “Depositum Fidei”.
           
Onde ocorre um debate teológico sempre aparece a figura do representante da Sé Apostólica, do Celam ou da Conferência Nacional dos Bispos. É ela que determina o tipo de resolução a que o debate pode chegar. Por exemplo: um Seminário sobre Planejamento Familiar não pode chegar a conclusões que divirjam das manifestações oficiais da Igreja católica. Nesses debates teológicos predomina a figura do teólogo mais comprometido com os ensinamentos dos papas do que com a situação concreta de milhões de casais. Se alguém dissesse que os representantes da Igreja não gostam de jogar fora de casa e em campo alheio, não faria mais do que dizer a verdade. Em poucas palavras: falta à maioria dos teólogos e representantes do Magistério Eclesiástico aquele espírito esportivo que caracterizou as polêmicas discussões de Jesus com os fariseus. Jesus fustigou com veemência o comportamento dos seus interlocutores sem que essa sua crítica envolvesse alguma espécie de agressão moral. Sempre e em todos os debates aparece o respeito que Jesus tinha pela liberdade e pelo direito que cada qual tinha de ter opiniões próprias. O alvo de seus anátemas foram as opiniões e não a pessoa do interlocutor. É isso que está fazendo falta no campo do debate teológico. Falta aos nossos treinadores e dirigentes eclesiásticos aquele espírito esportivo que transforma uma partida de futebol num verdadeiro espetáculo. Só pode haver espetáculo de verdade onde o resultado é imprevisível. Jogar com cartas marcadas é sujo e imoral. Mas não é precisamente este o jogo preferido dos que costumam falar em nome de Deus e da Igreja?
           
Digo isso tudo com a intenção de desmascarar os habituais defensores da ortodoxia. Não os critico pelo que estão defendendo, mas pelo modo com que o fazem. Não sabem competir intelectualmente. Querem explicar as verdades de modo tão claro que não possa haver mais lugar para dúvidas, ignorando que desta forma atentam contra o caráter misterioso da mensagem divina.

Crer não é apenas compreender. Bem no fundo não é mais possível crer quando se compreendeu. Basta ver, isto sim. Ter fé apenas no invisível e espiritual é um modo mutilado de crer em Cristo. Uma fé abstrata e intelectual que se ocupa mais com o pensamento de Jesus do que com a sua Pessoa e obras, e que, além do mais, pretende submeter o próprio texto sagrado a uma análise histórico-crítica, resulta estéril por lhe faltar o essencial que é seu caráter testemunhal. Uma leitura materialista da Bíblia é tão essencial quanto a outra, que consiste em ver o que nela vem narrado com os olhos da fé. O invisível torna-se completamente ininteligível no momento em que não tiver mais relação alguma com o visível.
           
Aplicando o que foi exposto ao Reino de Deus, temos que tomar o cuidado de não relegá-lo ao mundo das realidades invisíveis e espirituais. O Reino de Deus é um Anúncio, é, portanto, parte da Boa Nova. É também uma promessa e, como tal, faz parte de um Projeto a ser executado. Não deve ser visto apenas como uma espécie de oceano destinado a recolher, um dia, todo o esforço que os homens despenderam ao longo da história com o intuito de realizar seus pequenos sonhos de felicidade.

Padre Marcos Bach

quinta-feira, 19 de junho de 2014

O AMOR É GRATUITO E INCONDICIONAL

A crença na existência de um órgão espiritual destinado a pôr o espírito do homem em contato com o divino é anterior a Jesus Cristo. Já o filósofo grego Platão, que viveu três séculos antes de Jesus, fala da existência de uma “centelha divina” presente no interior de toda pessoa humana. Jesus apenas regou com as águas abundantes da sua Graça o que Platão e outros pensadores gregos tinham semeado.

A ideia de que o interior do homem é terreno devastado pela ação de um hipotético pecado original é incompatível com a mensagem otimista de Jesus. “Se alguém me ama e crê em mim, Eu e o Pai viremos a ele e nele faremos nossa morada” (Jo 14,23). Para que isto venha a acontecer só há um único requisito a preencher: abraçar, sem reservas, a causa de Cristo. Além do Amor que Deus nos oferece não existe mais nada que se possa classificar como exigência.

O amor é gratuito e incondicional, por isso ele é inegociável. Quando após uma briga um casal volta a fazer as pazes, isto não quer dizer que voltou a se amar novamente como antes ou até mais do que antes. Não há no terreno afetivo briga que não deixe sequelas.

Quem atingiu no terreno afetivo o nível de um amor perfeito como é perfeito o amor incondicional de Deus, pode fazer o que bem entende. O amor é o limite que separa o que é inegociável do que pode ser objeto de negociação. Deus não castiga ninguém. Menos ainda pensa em privar alguém do seu amor e da sua amizade.

O inferno foi criado por homens que, se não tiveram a intenção de fazê-lo, acabaram por insultar a Deus. Deus não usa o castigo como instrumento pedagógico. Sua resposta única ao pecado dos homens é o perdão e quando este não é solicitado sua resposta é a espera paciente. Um Deus que castiga, ou, ao menos está mais disposto a punir do que a perdoar, não deve contar com a simpatia de policiais e dos representantes da autoridade constituída. Jesus que o diga! Pois foram eles os responsáveis por sua morte.

Se queremos contar com o apoio de um aliado fiel e incorruptível devemos procurá-lo dentro de nós, pois é lá e não fora de nós que ele se encontra. Enquanto o ego passa o tempo nos iludindo, o superego se dedica à tarefa de zelar para que as exigências da parte já programada de nossa consciência venha a sofrer as consequências da atividade da parcela ainda livre da nossa consciência total.

Os planos ainda livres se encontram além do ego e fora do alcance da ação tirânica do superego. A psicanálise decompõe a consciência em suas partes, mas como a consciência não é um todo composto de partes, mas uma totalidade inconsútil, não será a análise que nos vai levar a compreendê-la. O cientista que viu isto melhor que outros foi o italiano Roberto Assagioli. Criou um método de atendimento psicológico a que deu o nome de Psicossíntese. Seu método é o oposto do método psicanalítico de Freud. Enquanto Freud via as árvores, mas não via a floresta, Assagioli chegou à conclusão de que a consciência humana era, em sua essência, uma estrutura verticalizada. Que ela ocupa o espaço psíquico elevando-se de baixo para cima. Onde Freud não via mais nada, Assagioli percebeu a presença de um patamar mais elevado da consciência total, ao qual deu a denominação de Eu Superior. A este Eu Superior Assagioli atribui a função que numa orquestra cabe ao regente.

A própria orquestra se autorregula. Isto é, a própria consciência regula a sua produção. Para isto ela precisa de se livrar da interferência não só da polícia, como da atividade perturbadora tanto do ego como do superego. Ambas estas instâncias representam o que se convenceu definir como “Cavalo de Troia”. São uma armadilha e dentro dela se escondem os que pretendem ter o direito de impor sua vontade a outros.

Padre Marcos Bach

quinta-feira, 12 de junho de 2014

O HOMEM NOVO EM IGREJA RENOVADA        

O que as Igrejas cristãs fizeram no sentido de implementar transformações sociais verdadeiramente significativas? Como iriam fazê-lo com alguma chance de sucesso se elas próprias representam nichos sociais privilegiados? E qual delas está disposta a mudar de rumo?
           
Jesus não depositou a menor confiança no judaísmo religioso do seu tempo. Não pactuou nem com os representantes do Império Romano, nem com os senhores do templo. Dedicou-se à tarefa de esboçar o perfil de um novo tipo de religiosidade cujo corolário mais “revolucionário” é a formação de um Novo Homem. Um Homem que tanto poderá ser homem quanto mulher. O objetivo principal de Jesus não foi o de fundar uma nova religião, mas o de criar um Novo Homem. Uma Igreja só merece o nome de cristã se for um lugar em que este Novo Homem poderá nascer e desabrochar!
           
O Vaticano, como todos os ambientes eclesiásticos, seguramente não é este lugar, pois não se parece em nada com um “Berçário”. É um ambiente por demais senil para merecer este qualificativo. Então, onde encontrar este berçário do Novo Homem que o teólogo jesuíta Karl Rahner descreve tão bem num opúsculo intitulado A Caminho do Homem Novo? (Ed. Vozes).
           
Ele existe perdido no meio do povo. Não possui atestado de batismo ou outro documento qualquer que comprove sua condição de Homem Novo. Não possui status religioso. Sua religiosidade dispensa ritos e cerimônias. É jovem, pois como poderia ser novo fosse velho, velho de corpo, de alma e de espírito? Não teme assumir riscos antes de todos os demais, o risco de promover mudanças. Quem tem que partir para a guerra são os jovens, porque ainda têm pouco a perder.
           
Nas cúpulas religiosas há demais pessoas temerosas de perder o fruto de uma carreira bem sucedida. Quem, cansado de um sistema religioso e moral excessivamente restritivo e acovardado, não sonha de vez em quando com uma Igreja diferente, em que é permitido avançar e progredir sem a obrigação de passar mais tempo respeitando limites do que ir até onde o Amor o impele? É este o perfil da autêntica Igreja de Cristo: um espaço social e cultural absolutamente aberto e livre, onde não é permitido impor limites além daqueles que a própria condição humana impõe.
           
Uma Igreja sujeita ao tipo de disciplina que alguns insistem em manter, não deve esperar que a História lhe seja propícia e que as novas gerações a aclamem e a amem com paixão.
           
Uma Igreja que não consegue mais do que cativar a mente de pessoas “idosas” e prematuramente “envelhecidas”, deveria pensar seriamente em sair de cena, dando deste modo lugar a uma Nova Igreja, jovem e dinâmica. Uma Igreja que tenha por hábito colocar-se em tudo à frente dos acontecimentos. Uma Igreja capaz de conduzir a humanidade e de levá-la a se distanciar do seu inglório passado, o mais possível.
                       
Existe um antagonismo radical entre o tipo de organismo social vampiresco e parasitário e o seu oposto, o organismo social sinergético e simbiótico. A diferença está no grau de participação dos membros todos no exercício do poder.

O povo católico, composto na sua maioria de pessoas humildes, nem sequer sonha com a ideia de assumir o poder e destronar o clero. O que a maioria deseja não é expulsar o padre e tomar o seu lugar. Nem sequer estão interessados numa Igreja sem padres e sem bispos. O que querem então?
           
Querem um novo tipo de relacionamento intraeclesial. Não querem ser lembrados apenas na hora de bater palmas à passagem do papa. Querem participar da vida da sua Igreja. Querem estar presentes quando e onde é discutido o futuro da sua Igreja. Não admitem que Cristo tenha tido a intenção de confiar todo o poder a uns poucos, excluindo dele a esmagadora maioria do Povo de Deus.
                       
Se Cristo nos redimiu para a Liberdade (Cf. Gl 5,1), então é condenável tudo o que impede o direito a seu exercício pleno. O conceito de “liberdade vigiada” é típico de regimes autocráticos. Lá onde se implanta um sistema bem montado de vigilância ideológica com a finalidade de manter sob controle o pensamento e a vontade do povo, não pode haver espaço para outra atitude que a de dizer amém e subscrever tudo o que já foi decidido.
           
O que queremos?
           
A humanidade precisa da Igreja de Cristo. Poderá ser a de Cristo uma Igreja que teme a liberdade mais do que os riscos e vícios de um regime despótico? Onde encontrar esta Igreja?
           
A Igreja católica certamente não é a encarnação viva da liberdade que Cristo nos veio trazer. É governada por homens que têm mais medo da liberdade do que do diabo. Até o papa admite que a Igreja tenha que converter-se.
                       
A vida da Igreja católica se encontra cristalizada há séculos em torno de um modelo estático. Não existe nela a mais remota chance de promover mudanças capazes de abalar a estrutura vigente e de pôr em risco a hegemonia da classe dominante. Ninguém deve esperar que o clero tome iniciativas destinadas a substituir por outro o modelo eclesial vigente. Por que os 400.000 clérigos que compõem a cúpula da pirâmide eclesial e constituem a espinha dorsal da Igreja de Roma iriam abrir mão de seus “sagrados” direitos?
           
“É a necessidade que ensina a gemer”, diz um ditado. O número de católicos anda em torno de um bilhão e duzentos milhões. Mas esta massa ainda não aprendeu uma lição que toda criança sabe: não aprendeu a gemer e a espernear. “Comem” tudo o que seus pastores lhes põem no cocho.
           
Os que “assistem” a missa aos domingos são os mesmos que à tardinha se acomodam ao pé de um aparelho de TV para acompanhar as peripécias dos personagens de suas novelas favoritas. A diferença está em que a novela é capaz de fazê-los chorar, algo que até um Marcelo Rossi é incapaz de conseguir.
           
A Igreja católica cometeu o grave erro de associar-se a um Império que já era decadente na época em que tomou esta decisão. O resultado foi idêntico ao que se pode esperar do casamento de uma jovem exuberante com um velho.
           
Como instituição a Igreja católica é tão “velha” e superada como o seria o Império Romano se ainda existisse. Todo o esplendor, pompa e grandeza com que a Igreja católica ainda costuma cercar a presença de seus “dignitários” ela o herdou do Império Romano. Tudo isto destoa escandalosamente do exemplo de vida de Cristo.

Padre Marcos Bach

quinta-feira, 5 de junho de 2014

O CONSUMISMO ESCRAVIZA O ESPÍRITO HUMANO

O consumismo representa uma das mais sorrateiras formas de escravizar o espírito do homem. Não há escravo mais digno de lástima do que aquele que sucumbiu à tirania dos seus próprios desejos e necessidades.

O terreno social abrange o relacionamento do homem com a natureza, com seus semelhantes, com Deus e consigo mesmo. Infelizmente é este o terreno em que o cristianismo colheu a maior parte dos seus fracassos. O nível do relacionamento entre indivíduos e povos é praticamente o mesmo da época de Cristo. O que piorou, e muito, é a maneira como os homens tratam a natureza. A carga de insensatez que nosso pobre planeta tem que suportar coloca-o à beira do colapso. Não é só o equilíbrio ecológico que está sendo perturbado de forma crescente. Em situação pior se encontra o equilíbrio emocional das pessoas. Para a maioria delas a vida se transformou numa corrida desenfreada contra o tempo. Pode alguém ainda levar a sério o conselho de Jesus: “Não vos preocupeis com o dia de amanhã?”. E o respeito pela vida em que pé anda?
           
A quantidade incrível de seres vivos e de formas de vida diminui a olhos vistos, ano após ano. Entre as espécies ameaçadas de extinção encontram-se representantes da biosfera que o homem não teve tempo sequer de conhecer! Em situação ainda mais lamentável encontra-se o respeito pela vida humana. Poucos são os direitos sancionados pela moral que o direito de matar! Não se pode matar pelo prazer de matar! Condenável é a prática dos caçadores de cabeças do Bornéo. Digno, porém, de uma Cruz de Ferro ou de uma Legião de Honra é o “herói” que matou o maior número de “inimigos”.
           
Quem quer matar à vontade tem que transformar em inimigos o maior número possível de semelhantes seus. Quem acha que não existe na atualidade ninguém interessado em dividir a humanidade em frentes adversas e inimigos ou é cego, ou é mal intencionado. Ou é otário ou é inocente útil, o que vem a dar no mesmo.
           
“O que fizerdes ao menor dos meus irmãos, a mim o tereis feito” (Mt 25,40).
           
Será que o impressionante número de crianças abortadas, mal alimentadas e mal amadas está chegando até os ouvidos do Criador? E todos aqueles que enxovalham a inocência de uma criança, por quanto tempo poderão continuar a fazê-lo? E as multidões que são obrigadas a se contentar com as migalhas que caem de mesas fartamente servidas?        

Comparadas com as ameaças que representam os estoques de armas químicas, biológicas e nucleares à espera da mãe de todas as guerras, existe um estoque ainda mais assustador de armas psicológicas e morais.
           
Na mão de um Francisco de Assis um fuzil se torna absolutamente inofensivo. A quantidade de armas e seu poder de destruição não constitui um problema em si. São as pessoas que dispõem deste poder que o transformam em problema. Para ser mais preciso: o problema são eles e não os “escudos defensivos” que estão construindo.
           
Quem são estes homens mais perigosos do que as armas de que podem dispor? Há uma palavra que os abrange a todos: são os donos do poder econômico! Pertencem a duas categorias sociais distintas:
        - Os autocratas que depositam mais fé no exercício do poder que nas virtudes do amor e da solidariedade fraterna.
        - Os plutocratas que atribuem valor maior ao lucro do que ao trabalho.
Tanto um como o outro dos dois sistemas de relacionamento social rebaixa as pessoas envolvidas no processo à condição de instrumento.
O poder e o dinheiro acabam por escravizar tanto ao que não o possui como ao que o possui. Existe um meio termo entre ter demais e ter de menos. Cristo o define com a palavra pobreza!
           
No mundo proposto por Jesus como ideal, pregado antes dele por Buda e sonhado por Marx, não havia lugar nem para miseráveis nem para ricaços bilionários. Na comunidade de fé proposta por Jesus também não há lugar para monsenhores e prelados. Não fazem parte do Projeto Eclesial de Jesus as diferenças hierárquicas que vigoram hoje em boa parte das Igrejas cristãs. “Ninguém dentre vós se chame de senhor, de mestre ou de pai, porque vós sois todos irmãos” (Mt 23,8).
           
Do ponto de vista religioso podemos classificar como perigosos aqueles que submeteram a mensagem de Jesus a um tratamento ideológico, o que os levou a re-interpretar as Palavras de Jesus à luz de conveniências político-culturais. A palavra que Jesus dirigiu a Pedro era esta: “Conforta teus irmãos”! Alguém dirá, a Igreja católica poderia ser diferente e até mesmo radicalmente diferente sem trair a sua missão essencial. Mas, qual é esta missão essencial?
           
Apascentar o Povo de Deus como um pastor apascenta seu rebanho? Sentar-se numa cátedra e redigir catecismos e cartas encíclicas? Não é o Anúncio da Boa Nova a sua missão essencial? “Pregai o Evangelho a toda criatura” (Mc 16,15). Também os enviou a pregar o Reino de Deus” (Lc 9,2).
           
Quem quer ser sucessor genuíno dos Apóstolos têm que endossar a identidade de um autêntico Apóstolo e levar a sério as recomendações feitas por Jesus a seus Apóstolos.
       
Uma Igreja que se adaptou tão bem ao “mundo dos negócios” que não consegue mais distinguir e separar o essencial do regimental, certamente não está colocando os pés nas pegadas de Cristo e de Paulo de Tarso. É possível que a Igreja católica se tenha tornado prisioneira de negócios e de atividades que já não fazem mais parte da sua Missão Essencial. “Ide e pregai...”, quantas vezes Jesus repetiu esta frase!
       
“Ai de mim se não pregar...” (I Cor 9,16).
       
Pregar, na época de Cristo, era bem mais cansativo e perigoso do que hoje, já que se tornou possível conversar com pessoas de todo o mundo sem sair de casa. Aí está a Internet, o telefone, o celular, etc. Paulo, se fosse vivo, certamente se faria ouvir via Internet.

Padre Marcos Bach