quarta-feira, 30 de julho de 2014

JOGO DE INTERESSES NA POLÍTICA

É ingenuidade total querer construir uma sociedade humana merecedora de confiança sobre o que costumamos definir como “jogo de interesses”. O interesse sempre nasce do desejo de “levar a melhor”.

Um organismo social em que todos apostam primariamente em seu próprio interesse já nasce doente e sem condições de oferecer à humanidade futura outra perspectiva do que uma ilusão a mais. Depois do medo não há impulso mais nocivo à boa ordem social do que o egocentrismo, a ganância e a avareza. Apostar na competição é o mesmo que apostar nas “virtudes” das mais incontroláveis formas de paranoia. Apostar na competição é o mesmo que consagrar a guerra como forma de promover o progresso social.
           
Se para Clausevitz a guerra era a continuação da política por outros meios, para um banqueiro capitalista ela é um “negócio” tão “justo” quanto uma fusão de bancos. É absolutamente absurdo admitir que o futuro da humanidade possa ser decidido em campos de batalha. Mas é precisamente isto que está sendo apregoado nos arraiais neoliberais e globalistas do pensamento econômico atual. “Vamos competir”, dizem os gurus da economia competitiva. “Só o fraco e o covarde temem a competição”. Será mesmo?

Quando alguém diz que a Igreja não deve meter-se em política, está sendo hipócrita. A Igreja está repleta de políticos, de homens que vivem fazendo política. É um fato que por si mesmo não mereceria reproche, se esta atividade toda tivesse como origem o desejo de servir por amor e com amor.
           
Quem quer ser realmente útil a seus irmãos começa por envolvê-los num grande abraço, cheio de amor. Ghandi dizia: “Meu desejo é poder abraçar um dia a humanidade toda”!  Francisco de Assis fez mais pelo bem-estar espiritual da humanidade do que todos os papas de sua época.
           
Há uma dimensão do poder que consiste em dominar outros, em impor a sua vontade, o que por iniciativa própria jamais iriam querer. É a potestas dominativa, tão cara a todos os tiranos e ditadores. 

Existe, no entanto, outra dimensão do poder e outra forma de exercê-lo, muito mais próxima do modo como o Senhor do Universo costuma exercê-lo. O que caracteriza o modo como Deus exercita o seu poder de Senhor Supremo do Universo é o profundo respeito pela liberdade dos demais agentes do processo evolutivo universal. O Criador é especialista na arte de delegar poderes. Caso típico é o processo procriativo.
           
Político hábil e empresário inteligente é aquele que cria um organismo social em que todos têm condições de investir nele o máximo de suas capacidades.

Imagine o leitor uma sociedade em que o primeiro artigo da Constituição rezasse assim: “Amai-vos uns aos outros sem reservas! E sem temer excessos. Retribuí em dobro todo amor que vos é dado! Sabei que o Amor é o mais divino dos dons e a mais preciosa e poderosa faculdade com que o Criador dotou o homem. O Amor eleva o espírito do homem acima de tudo que não é Deus. Acima dos Anjos e das potestades todas do Céu. Quem ama torna-se igual, e não apenas semelhante a Deus. O Amor não é apenas a mais poderosa energia do Cosmos. É, acima de tudo, o que no homem existe de mais divino! 

Aquele que ama participa de alguma forma da vida íntima do próprio Deus. Todo gesto de amor é um ato de extrema generosidade. É um ato de loucura, diria o apóstolo Paulo. Pode haver amor mais louco do que aquele que não impediu Jesus a se deixar pregar numa cruz? O sofrimento que purifica e salva não é aquele que nasce da falta de amor. Jesus não assumiu juntamente com a cruz o papel de vítima do pecado dos homens. A cruz é símbolo da vontade redentora de Deus. A intenção de Cristo ao abraçar a cruz foi a de provar que o Amor de Deus é infinitamente maior do que o pecado dos homens! O que Jesus quis ensinar a quem tem ouvidos para ouvir e disposição para aprender é o seguinte: fora do amor não há salvação! 

Não há um só problema humano que não seja consequência da falta de amor. A contrapartida lógica só pode ser esta: não há possibilidade de solução que não nasça do amor. Elimine o oxigênio da atmosfera terrestre e dentro de pouco tempo não haverá mais vida em nosso planeta”!
           
Numa roda de políticos ou de funcionários da Cúria Romana uma proposta como a que acabei de formular seria acolhida com sorrisos sardônicos. O “cara está louco”, diriam. “Política”, diriam, não se faz indo ao encontro do povo! O povo, dizem todos os autocratas, “não sabe o que é melhor para ele”.
           
Os espertos e falsos amigos do povo aproveitam este “vazio” político para infiltrá-lo com a figura do “pastor”, do “comissário”, do grande líder. A história recente é rica em exemplos de como explorar a ignorância e a falta de consciência política do povo.

Padre Marcos Bach

quinta-feira, 24 de julho de 2014

FAZER POLÍTICA NO SÉCULO XXI

Meio século atrás ainda existiam no Brasil as famigeradas Ligas Eleitorais Católicas. Hoje não existem mais porque o homem moderno não pede mais ao padre a bênção para sua candidatura quando resolve ser candidato.
           
Os tempos mudaram! Política é a arte de dirigir uma cidade (= polis), de fazer dela um lugar seguro, confortável, acolhedor e aberto a todos aqueles que sabem como conviver fraternalmente com seus vizinhos.

Cidade é, acima de tudo, um espaço cultural e social definido e sustentado por um conjunto de cidadãos dotados de um nível de consciência político-social e ético radicalmente mais elevado daquele que se exige de um homem do campo.
           
Encher uma igreja de beatos e carolas é fácil. Mesmo nas grandes metrópoles a parcela maior da população é composta de gente que veio do campo. Qual o morador de uma cidade convicto de que a cidade em que mora é a sua cidade?
           
Na Europa é fácil encontrar quem se orgulhe de sua cidade. Nossas cidades mais se parecem com “dormitórios” do que com outra coisa. A maioria dos nossos urbanistas se esquece de um detalhe significativo: uma cidade não pode ser vista e planejada como passageira, temporal e transitória.

Uma cidade que se preza insiste em desafiar o tempo, a lei da degradação. O orgulho de um homem digno deste nome é poder ser cada vez mais o que é! O mesmo vale para a cidade, obra máxima do gênio político humano.
           
Uma cidade é muito mais do que um conjunto de edifícios, casas e ruas. O centro de Atenas era a Agorá, a Praça, e, em Roma, era o Forum que desempenhava a mesma função. A Praça era lugar público para a qual convergiam todas as ruas da cidade. Lá se discutia de tudo, desde filosofia até religião.

O filósofo Aristóteles dava suas aulas caminhando com seus alunos pela Agorá. De peripatein (que significa caminhar em volta) vem a palavra peripatético, nome dado ao método pedagógico de Atistóteles.

A Praça e os edifícios que a rodeavam constituíam uma espécie de centro nevrálgico. Era o lugar em que a vida da cidade pulsava com mais intensidade. Era espaço nobre reservado a atividades igualmente nobres, das quais o comércio não fazia parte. Por trás do conceito de cidade = polis, urbs, Stadt esconde-se uma filosofia de vida. E um conceito peculiar de fazer política.
           
A cidade grega era o coração pulsante de toda uma região. Em comparação com ela nossas modernas megalópoles mais se parecem com gigantescos tumores cancerosos do que com cidades.
           
Cidades sempre as haverá. São os grandes monstros urbanísticos que estão com os dias contados. Todo tumor canceroso sempre acaba destruindo-se a si próprio. Todo processo de crescimento tem um limite além do qual o que era crescimento passa a ser hipertrofia.
           
Por que permitir que tanta gente se junte e se amontoe no mesmo lugar? Formigas fazem isso, mas por serem formigas sabem como organizar a vida em formigueiro. Ideólogos há que gostariam de imitar a sabedoria das formigas e aproveitá-la na hora de planejar o convívio social humano. Esqueceram-se estes senhores de que homens não são formigas.
           
Todo regime totalitário se baseia na crença de que o ideal político é transformar os centros sociais humanos em colmeias, formigueiros e os homens em rebanhos. Pensar é uma atividade perigosa. Permitir que todos possam pensar e expressar o seu pensamento seria o mesmo que revelar os segredos da energia atômica a quem estivesse interessado. O que os que temem a força e o poder do pensamento humano esquecem é o seguinte: cada ser humano possui um cérebro próprio e é dono dele!

Padre Marcos Bach 

quinta-feira, 17 de julho de 2014

PRESENÇA DO AMOR

O cristianismo comercializou a prática do amor! “Ama o teu próximo, a tua esposa e teus filhos porque, se assim o fizeres, terás como recompensa o fabuloso lucro de cem por um”!
           
Camus tem razão. E eu acrescentaria a suas críticas esta outra: “O cristianismo oficial rebaixou a sublimidade do amor ao transformá-lo em obrigação moral”.
           
O que você responderia a alguém que lhe dissesse: “Eu amo a quem quero, porque quero e como quero! Não admito que alguém venha a intrometer-se neste assunto com a intenção de me fazer prescrições”! O que Camus quer afirmar é que nós, cristãos, por culpa de marqueteiros religiosos, perdemos de vista a mais característica de suas riquezas que é a gratuidade.
           
Quem ama não ganha nada, mas perde tudo o que não é essencial! O amor enriquece a quem ama e ao que é amado! O amor dispensa acréscimos e compensações. Assim como o valor intrínseco do ouro nada tem a ver com a cotação que possui no mercado, do mesmo modo o amor independe da cotação moral ou religiosa.
           
O discurso oficial das Igrejas todas é basicamente o mesmo de dois séculos atrás! Desde então aconteceram revoluções que abalaram praticamente os fundamentos todos da assim chamada ordem estabelecida. Fracassaram todas as tentativas de restaurar a hegemonia do tempo passado sobre o tempo futuro. Os únicos campos em que ainda há espaço para concepções fundamentalistas são o político e o religioso. No terreno econômico não há mais lugar para fundamentalistas e ideólogos. O mesmo se pode afirmar a respeito do campo das atividades científicas.
           
Tem toda a razão o físico David Bohm quando constata que tanto a evolução da vida como a revolução dos corpos celestes é, antes de mais nada, uma complexa e poderosa manifestação de amor!
           
O que é o amor na visão de um cientista como Bohm senão a alma e a energia constitutiva de um cosmo em contínua transformação? Refletindo como fizeram Einstein, Heisenberg, Bohm e outros muitos mais, chega-se a ter uma ideia da distância que separa o pensamento mecanicista de um Newton da concepção holística de um físico moderno.
           
O que a muitos se parece com distância, a outros se apresenta como fosso intransponível. Um deles era o filósofo francês Charles Peguy. O mundo mudou tanto que é simplesmente impossível reatar a ligação do presente com o passado!
           
O que é mais importante: saber como nossos antepassados enfrentavam os desafios da sua curta existência ou procurar obter alguma resposta aproveitável às interrogações, promessas e esperanças ocultas no bojo de um futuro aparentemente imprevisível.
           
O passado é pobre em lições verdadeiramente significativas!         É o futuro que devemos interrogar e perscrutar se queremos ter uma ideia mais exata da vontade e das intenções de Deus!
           
Como pode a verdade ocultar-se em algo que ainda não aconteceu? Engana-se quem pensa que o futuro consta apenas de eventos que ainda estão por acontecer. Não podemos dividir nosso tempo de vida em passado, presente e futuro sem complicar desnecessariamente a ação de Deus. No Pensamento de Deus não existe nem passado, nem futuro! Tudo é apenas presente!
           
O mesmo se pode dizer em relação ao tempo psicológico humano. Nos planos mais sutis do inconsciente humano só o momento presente é real. O tempo psicológico do homem não é feito de momentos que se sucedem, mas é um instante que jamais sofre solução de continuidade, nem de noite quando dormimos, nem de dia quando desmaiamos. Não é correto comparar o fluxo do tempo com as águas de um rio. Melhor é compará-lo com o que acontece no interior de uma semente em trabalhos de parto!

Padre Marcos Bach

quinta-feira, 10 de julho de 2014

CARACTERÍSTICAS DA PRIMEIRA IGREJA DE CRISTO    

É falsa a crença de que Jesus, ao se despedir do cenário histórico, tenha legado a seus discípulos um Projeto mal definido ou até se tenha abstido de se preocupar com a continuação da obra por Ele iniciada.

“Não vos deixarei órfãos, mas estarei convosco até a consumação dos séculos” (Mt 28,20). Esta palavra de Jesus foi perdendo força e credibilidade à medida que os apóstolos foram morrendo e seu lugar foi ocupado por “representantes de Cristo na terra”.

“Enviar-vos-ei o meu Espírito e ele vos ensinará na hora certa o que deveis de dizer” (Lc 12,12). Também esta palavra de Jesus acabou se perdendo em “ouvidos de mercador”!

Os primeiros cristãos não se sentiam órfãos, nem se comportavam como tais. Paulo se dizia apóstolo de Cristo, mas nunca se fez passar por “representante de Cristo”. Paulo nunca se atribuiu outra “autoridade” que aquela que lhe conferia a sua “incondicional fé em Cristo”. No fim de sua sofrida existência diz com orgulho: “Completei a carreira, guardei a fé” (2 Tm 4,7).

O Cristo que o apóstolo Paulo pregava não é um Cristo ausente e distante da vida concreta dos membros de suas comunidades. É um Cristo que se alegra com os que estão alegres e sofre com os que sofrem.

A IGREJA DOS APÓSTOLOS

Um bom retrato da Igreja apostólica nos é fornecido pelo livro Atos dos Apóstolos! São várias as características desta Igreja:

- Ela era doméstica, pois os seus membros se reuniam em famílias. No início o Templo de Jerusalém e a Sinagoga eram frequentados pelos cristãos, mas após a destruição do Templo e a dispersão dos judeus, as comunidades cristãs passaram a se distanciar cada vez mais da sinagoga e do judaísmo, adquirindo personalidade religiosa própria. As “igrejas” fundadas pelo apóstolo Paulo eram pronunciadamente domésticas e seus líderes eram chefes de família. Uma nota distintiva desta “igreja” era a posição destacada que nela ocupavam as mulheres. Lídia (Atos 16,14) e Priscila (Atos 18,2) são mulheres que, devido à sua posição social, muito contribuíram para a difusão da Fé Cristã. Ao traçar o perfil do bispo em sua carta a Tito, descreve-o como “marido de uma só esposa” (Tito 1,6).

- Ela era eminentemente “comunitária” e em certa medida até “democrática”. Dos seus membros o povo dizia: “Vede como eles se amam!”. Quando o apóstolo Pedro tomou a decisão de preencher o número dos “doze”, confiou à Comunidade a tarefa de escolher o substituto de Judas, o Iscariotes.

- Outra característica das primeiras Comunidades Cristãs era a crença na volta iminente de Cristo para completar a sua obra e iniciar a instauração do Reino de Deus. A “parusia”, isto é, o retorno de Cristo, era tido como iminente. Algo que poderia acontecer ainda em vida dos mais jovens. Esta crença motivou muitos “proprietários” de terras a vendê-las e a depositar o dinheiro, assim obtido, nas mãos dos Apóstolos. Tudo o que os membros da Comunidade possuíam era considerado “propriedade comum”! Este “comunismo” da Igreja Primitiva diferiu num aspecto fundamental do “comunismo” de Karl Marx, pois nele o direito de gerir os bens e de distribuí-los era exercido pela Comunidade, representada na figura do “diácono”, em lugar de confiar esta função ao Estado, representado na figura do “Comissário”!

- Na Igreja Primitiva ainda não havia espaço para a figura do “sacerdote”. O apóstolo Paulo se autodefine orgulhosamente como apóstolo de Cristo, mas não há uma única passagem em suas cartas em que se defina como “sacerdote”!

A “missa”, como a conhecemos hoje, só foi inventada mais tarde. Os fiéis se reuniam em “Assembleia” e a “Celebração Eucarística” era definida como “Banquete”, como “Ceia”, pois era realizada no fim do dia. A palavra “ágape” (= “banquete”) era empregada para definir o que se estava realizando. A ideia de definir como “sacrifício” o que se estava fazendo só apareceu mais tarde! O “culto litúrgico” era visto, antes de mais nada, como repetição simbólica do que acontecera no Cenáculo em Jerusalém e que passou à história com o nome de “Última Ceia”. Só bem mais tarde este gesto litúrgico passou a ser interpretado como símbolo do “sacrifício de Cristo na cruz”!

A diferença entre a atmosfera que reina num banquete e a que caracteriza a execução de uma sentença de morte é absoluta e total. Por isso pode-se afirmar que os cristãos da Igreja Primitiva estavam mais próximos da verdade e do pensamento de Jesus do que os atuais “rezadores de missa”.

Jesus não morreu na cruz na condição de “vítima” da maldade humana. Entregou-se livre e espontaneamente nas mãos de seus inimigos e algozes.

“Por isso o Pai me ama porque eu dou a minha vida e novamente a reassumo! Ninguém m’a tira e eu a ofereço espontaneamente” (Jo 10,17). Mais que vítima da maldade humana Jesus foi “vítima” de seu imenso amor pelos homens. É por isso que os primeiros cristãos foram mais sábios do que nossos teólogos de hoje. Cristo encerrou em caráter definitivo a era dos “sacrifícios” dando início a uma “Nova Era”! Ninguém tem mais o direito de tirar ou de invadir a vida de alguém!

Padre Marcos Bach

quinta-feira, 3 de julho de 2014

CONSTRUÇÃO DA DEMOCRACIA

A autêntica democracia pressupõe da parte do povo um nível de consciência política que povo nenhum do planeta possui. O povão gosta de homens fortes e quer ser governado por um deles, de preferência ao governante sábio. Não morre de amores pela liberdade. Teme-a e a troca com facilidade por um bom prato de macarrão. Não ama a liberdade porque sente que ela o iria comprometer com responsabilidades que não quer assumir. Preferiria sentar à mesa e comer em restaurante bem barato.

Quem não sabe que o povão é paciente? Sabe esperar! Sempre está à espera de algum milagre. À espera de um caudilho ou de um guru milagreiro. Não está interessado em fazer. Quer é receber. Pertence ao tipo de mendigo que se julga no direito de entrar em greve quando a esmola desaparece ou começa a minguar. O povão se comporta diante de uma repartição pública como o fazia antigamente uma turma de mendigos diante das portas de um convento. O sopão, a distribuição gratuita de “cestas”: tudo isso é esmola e só serve para rebaixar ainda mais o já baixo nível de consciência política do nosso povo.
           
Os políticos desempenham a função de esmoleiros. Sua atuação política se resume em distribuir “favores” que no fundo nada mais são do que “esmolas”. De si e do próprio bolso não tiram nada. O que distribuem é dinheiro público, dinheiro que não lhes pertence. É raro ouvir falar de alguém que deixou a política, ficar mais pobre do que ao entrar.
           
Entre romanos e gregos a atividade política era gratuita. Só quem possuía bens e não precisava da atividade política como fonte de renda podia candidatar-se a Senador Romano.
           
Numa democracia o povo é sujeito. É cidadão, é construtor da sua cidade, guardião e defensor das suas instituições e não apenas eleitor, sem outra escolha senão a de votar.
           
Não existem em nosso mundo atual democracias, sistemas de governo que mereçam este nome. Existe o Ideal Democrático, cantado em prosa e verso, mas apenas como sonho e como utopia. Por ora ainda vigora o ditado romano: “Populus vult decipi, ergo decipiatur”. O povo quer ser iludido e enganado. Não lhe agrada ter que ouvir a verdade e evita encontrar-se com a realidade. Vota em quem mais promete.
           
De momento a prática da democracia só é possível em pequenas comunidades, constituídas de pessoas de alto nível de consciência social e moral. Não é preciso que esta comunidade seja religiosa. Pode ser uma ONG ou coisa parecida. Nela predomina a unanimidade em questões tidas por todos os seus membros como fundamentais e essenciais, mas em questões que não afetam o essencial haverá amplo espaço para a diversidade de opiniões.
           
Um organismo comunitário exige dos seus componentes um alto grau de paixão, de “tesão política”. Uma democracia não se constrói empunhando “planilhas” e baseando-se em “ibopes” ou dados estatísticos. Uma democracia se faz com amor, muito amor e muito respeito pela liberdade de cada membro. O ideal político de uma comunidade é criar espaço, o mais amplo que for possível, para pessoas que queiram viver a sua vida da maneira mais livre que lhes for possível.
           
Já que não é possível transformar megalópoles como São Paulo em paraísos democráticos, sempre resta a possibilidade de transformar o próprio lar, o condomínio ou o bairro residencial em algo menos parecido com uma casa de detenção ou um campo de concentração. Convém não perder de vista que poucas cidades foram projetadas e construídas de cima para baixo, como Brasília. A maioria delas nasceu como aldeia e cresceu de baixo para cima. Seria uma tremenda catástrofe política se o Brasil de amanhã fosse no concerto das nações o que a cidade de Brasília é hoje. Um “quisto”, um tumor canceroso e cancerígeno da pior espécie.

Padre Marcos Bach