SERÁ QUE PODEMOS OPTAR PELA QUALIDADE DE VIDA
“Pereat
veritas, fiat vita”.
Nietzsche não deixa de ter um bocado de razão: “De
tanto nos ocupar com a verdade acabamos perdendo o contato com a vida”. Com a
vida humana, em especial.
Quem mata e manda matar do jeito como este afazer foi
praticado nos últimos cem anos, não pode dizer que ama a vida.
Quem vive a espécie de vida que se vive hoje nas
grandes cidades, não tem credibilidade moral quando se proclama amante da vida.
Quem tem amor à vida a ama em todas as suas
manifestações. Este amor se manifesta em todas as frentes onde ela corre
perigo.
Declarações sobre a dignidade da pessoa humana e o
respeito à vida não é o que falta. Nenhuma delas impediu até hoje a matança de
baleias inermes e inofensivas, a extinção simples e pura de espécies animais
inteiras, para não falar no aborto e na matança pela fome.
A terra é generosa, os homens é que não o são. A fome
é o subproduto da falta de generosidade da parte mais rica da humanidade.
Os cristãos representam o grosso desta parcela
opressora e exploradora da humanidade. Isto significa que não compreenderam em
absoluto o seu Mestre. “Ut habeant vitam...”
“Eu vim para que os homens tenham vida”. Não aquele mínimo de vida que mal dá para
a sobrevivência.
Aquele que passou a existência no limiar que separa a
vida da inanição, não chegou a viver de verdade. Como se pode falar em vida
espiritual, saúde psíquica aonde a sobrevivência física não vai além do nível
vegetativo? E não é apenas o faminto subnutrido que, via de regra, não faz mais
do que vegetar. O rico opulento que devora a comida, o sexo e o dinheiro também
é um mero vegetal travestido de homem. A fome e a voracidade não costumam
inspirar bons pensamentos.
Também não têm o poder de nutrir bons sentimentos e
aspirações de alto nível espiritual. Fizeram bem os bispos da América Latina
quando de público se colocaram do lado da multidão milionária de famintos e
subnutridos deste Continente. Se a intenção deles não foi a de acabar com a
fome (e não apenas com os famintos) seu gesto não terá sido mais que um truque
demagógico. Todo o mundo sabe que declarações e discursos nunca mataram a fome
de ninguém. Só há um jeito de matá-la: comer.
O ato de comer está tão profundamente ligado à vida,
que pão e vinho acabaram se transformando em símbolos da manifestação da forma
mais sublime de vida, que é a Vida de Fé.
O ato de comer tem para o homem um significado que
ultrapassa o plano vegetativo de um modo absolutamente radical. Comer passa a
ser um modo de alimentar o espírito.
“Quem comer deste pão viverá eternamente” (Jo 6,51).
É por esta razão que a falta de pão na mesa do pobre é tão trágica. Pela mesma
razão não pode haver lugar na “mesa do Pai” para os ricos e vorazes glutões.
Padre Marcos Bach