quinta-feira, 31 de dezembro de 2015


UNIDADE NA DIVERSIDADE


O Movimento Ecumênico Cristão é formado por pessoas que se deram conta de que o maior inimigo do cristianismo não são as divisões de Stalin ou Hitler, mas a divisão das Igrejas. O Papa João XXIII percebeu isto como poucos.

O Concílio Vaticano II não conseguiu convencer os setores mais ativos da Igreja católica que chegara a hora de saber morrer para poder ressuscitar. Sou católico e a mim me interessa o futuro da minha Igreja. Na minha vida a fé em Cristo é essencial. Minha fé na Igreja católica é condicionada à capacidade de seus “pastores” de se adaptar às exigências de uma sociedade sujeita a violentas transformações. Incondicional é a fé em Cristo, mas a fé numa determinada Igreja só pode ser condicional. A mais cristã das Igrejas é tão imperfeita quanto o são as estruturas da sociedade à qual se integrou.

Tanto a Igreja católica quanto as de rito oriental incorporaram em seus regimes de governo vícios do antigo Império Romano. Citemos um exemplo que fala por todos os demais: o poder de governar a Igreja está concentrado na vontade soberana de um único homem, o Papa. É ele a única pessoa que só é responsável perante Deus e à sua consciência. Além dele não há mais nenhum católico que tenha tamanha liberdade.

Quem acha que tamanha concentração de poder favorece a salvação das almas engana-se, tanto quanto aquele tipo de empresário da era industrial que ainda podia permitir-se o luxo de tratar sua empresa como propriedade pessoal.

Por toda parte começam a surgir movimentos políticos destinados a unificar determinados setores da vida humana. Fronteiras começam a desaparecer ou perder seu caráter de trincheira. Tudo isto é altamente positivo e desejável do ponto de vista cristão, desde que não se faça confusão entre unidade e uniformidade.

A uniformidade resulta de um processo em que só uma única medida se torna obrigatória. A palavra ideologia expressa muito bem o que os regimes totalitários têm em vista.

Idion é uma palavra grega e significa, o mesmo. Daí vem o termo idiota: o homem de uma só ideia. Daí vem também o termo ideologia que representa a redução da multiplicidade de ideias e formas de organização social a um único denominador comum.

Ein Volk, ein Reich, ein Führer” proclamavam os epígonos do pesadelo nazista.

Uniformidade é unidade mutilada. Existe uma diferença fundamental entre a unidade que é imposta de cima para baixo e de fora para dentro e a que resulta de algo que se poderia definir como consenso interior.

A unidade orgânica e ecossistêmica que a natureza adotou é uma unidade consentida e livre, e se impõe por si mesma. Criar e organizar unidades sempre mais complexas: é este o objetivo último de todo processo evolutivo. Este objetivo o perseguem tanto os componentes da biosfera quanto os da noosfera. A natureza pode servir muito bem de modelo já que nela todo progresso resulta de uma síntese mais complexa do uno com o múltiplo.

Eliminar as diferenças é o mesmo que enfraquecer o elo de união que mantém vivo um corpo, seja ele biofísico ou social.

Sistemas sociais inspirados no conceito totalitário e autocrático de unidade são por natureza inimigos declarados da liberdade por serem hostis por princípio ao direito que cada entidade individual tem de ser diferente das demais. É este o lado fraco de qualquer religião, ao qual a Igreja católica sucumbiu tanto quanto o Islamismo.

Quem vai escrever daqui para frente a história da humanidade vai ser o homem. Quem vai escrever a história futura da Igreja de Cristo serão aqueles que descobrirem, por conta própria, que o cristianismo é em sua essência um modo desmesuradamente generoso e ousado de viver a vida sem peias nem restrições. O autêntico discípulo de Cristo dispensa leis, currais protetores e qualquer tipo de tutor. Quem é verdadeiramente livre como Cristo o era, mede a sua liberdade e o direito de vivê-la, tomando como critério sua própria liberdade. O verdadeiramente livre não precisa justificar sua liberdade. Ele obedece em tudo o que faz de certa forma a si mesmo, segundo impulsos que lhe vêm do íntimo da sua consciência livre.

Padre Marcos Bach

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