quarta-feira, 4 de setembro de 2013

COMUNIDADE NA AMIZADE E NO SERVIÇO

O que é ameaçador, sob todos os aspectos, é a incapacidade da humanidade atual de enfrentar o seu próprio futuro com a leveza com que Davi enfrentou Golias. O que deu a vitória a Davi foi a sua agilidade e sua perícia no manejo da funda. Foi inteligente, pois percebeu que o único lugar vulnerável no corpo de Golias era a testa. O lado fraco da nossa civilização, como do nosso mundo globalizado, não é a testa, mas é o coração. É um mundo sem coração e sem amor. Não vejo exagero na afirmação de que o problema de todos os problemas do nosso tempo é a nossa incapacidade de dar e de receber amor. O “amor perfeito” só o cultivamos em nossos jardins, fora daí ele é tão raro, que psicólogos da estatura de Erich Fromm, Rollo May e Viktor E. Frankl chegaram a constatar que uma “bela amizade” é um feito raro e difícil de se encontrar. “Um Grande Amor só acontece duas ou três vezes em cada século”. A afirmação partiu de um ateu chamado Albert Camus.

Se um Grande Amor e uma bela amizade são raros, então deve ser pequeno o número de cristãos autênticos, pois o critério de avaliação de uma comunidade cristã “é o amor com que seus membros se amam uns aos outros” (Jo 15,17). No terreno da afetividade e do amor é infinito o campo aberto ao desenvolvimento espiritual da humanidade. Neste campo pouco ou quase nada foi feito e o que está sendo feito é por demais tímido para responder à demanda crescente de Amor. Pequenos amores, que nascem e morrem antes do anoitecer do primeiro dia de vida, temos muitos. Mas se amigo, amigo mesmo, é alguém “que está disposto a dar a sua vida pelos amigos” (Jo 15,13), quem de nós pode dizer que é amigo e que possui um “milhão de amigos”?

Quem quer ser amigo como Cristo o foi, deve renunciar a toda e qualquer pretensão de poder. Quem se considera revestido do direito de impor sua vontade a de outros, pode ser alvo de pomposas manifestações populares, mas não está mais em condições de ser amigo. Para poder ser amigo de alguém é preciso dar-lhe o mesmo amor com que me amo a mim mesmo. Se não for capaz de respeitar suas ideias e seus sentimentos como gostaria que fosse respeitado o que eu penso e sinto, então falta algo de essencial à minha capacidade de fazer amigos. E se não sei fazer amigos, é falso o cristianismo que professo. Na hora de repartir o bolo se pode ver quem é amigo ou não: se vou ser eu quem distribui as fatias, a fatia maior irá sempre para o meu melhor amigo.

Uma das características que distingue o amor erótico do amor de amizade está em que este último gera um tipo de igualdade que o primeiro desconhece. Quando os apóstolos se meteram a discutir a questão do primado, procurando saber “quem deles era o maior” (Mc 9,34), Jesus lhes avisa: “O maior dentre vós é aquele que se tiver feito vosso servo” (Mt 23,11).

In: Manuscrito de Pe. José Marcos Bach, sj

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