AS POTENCIALIDADES DA
NATUREZA ESPIRITUAL
“Minha verdadeira casa paterna é o Céu”, dizia Teresinha de Lisieux.
Sentindo a morte próxima, São João da Cruz pediu que lhe lessem passagens do
Cântico dos Cânticos.
O êxtase resultante da visão
antecipada da glória de Deus, do gozo antecipado da união amorosa da alma com
seu Deus, representa a marca registrada da autêntica vida cristã. O cristão é
por vocação e por opção pessoal uma pessoa que sabe amar e alegrar-se como
ninguém.
Uma comunidade cristã é formada por pessoas que sabem amar como Jesus ama
e que sabem explorar as grandes e pequenas alegrias que a vida oferece tão
generosamente. A autêntica comunidade cristã é formada por pessoas que vivem
com os pés no chão, mas com a cabeça bem erguida. Um cristão não foge deste
mundo e não abandona este vale de misérias e de lágrimas. Chora com os que
choram, mas sabe que lágrimas brotadas do desespero e da comiseração podem ser
tão estéreis (e até mesmo hipócritas) quanto o sofrimento que as provoca. A
maior parte do sofrimento é produzida pelos próprios homens. Há os que sentem
prazer em infligir sofrimento a outros. São os sádicos e torturadores
profissionais. Bem mais numeroso é o time dos que se fazem sofrer a si
próprios. Todo viciado é especialista
na autopunição.
Quanto tempo e boa fé é gasta com o propósito de recuperar viciados em
droga! Um viciado em droga ou sexo nunca mais poderá voltar a ser o mesmo que
já foi. A palavra recuperação é pobre demais para expressar tudo o que é
necessário para que um dependente volte a ser novamente uma pessoa normal. Só
uma verdadeira conversão é capaz de operar este milagre.
A exploração plena de todas as potencialidades da natureza espiritual do
homem é empreitada que excede por completo a capacidade ou competência natural
do homem. É necessário que alguém o tome pela mão e o conduza. Que alguém o
tome nos braços e o leve aonde com suas próprias forças não consegue chegar. A
genuína conversão no sentido em que Cristo emprega o termo (Mt 18,3), é obra de
Deus e dom divino. Representa uma
reviravolta total: “O velho homem”, diria Paulo, “terá que morrer para que o
novo homem possa nascer”.
Todo parto é doloroso. Também este que dá origem ao “Novo Homem” idealizado por
Cristo, é acompanhado de sofrimento. Que o digam os profetas e os místicos!
Se a Igreja quiser recuperar a
credibilidade perdida, não basta reconhecer que pecou e que errou. Em outras
palavras: uma simples conversão moral, por mais sincera que venha a ser, não
basta. É preciso pensar numa outra Igreja, mais parecida com a dos Apóstolos de
Cristo. Uma Igreja radicada na alma do povo. Uma Igreja tão pobre que possa
permitir-se o luxo de dispensar toda e qualquer segurança que não seja a do pobre.
Uma Igreja pobre estaria a salvo
de quase todas as tentações a que a Igreja dos papas sucumbiu ao longo de sua
história. Rico é aquele que muito tem a perder. Pobre é alguém que não tem nada
que lhe possam roubar. Miserável é aquele que precisa roubar para sobreviver.
A pobreza de que estamos falando encontra-se no meio do caminho entre a
riqueza e a miséria. É a pobreza de espírito a qual Jesus se refere no Sermão
da Montanha. “Felizes os pobres de espírito...” (Lc 6,20). Toda pessoa sensata
sabe que possuir mais que o necessário a uma vida confortável costuma gerar
mais problemas do que alegrias. Nem o ricaço nem o miserável sabem o que é ser
feliz. Ambos dormem mal. Um porque não tem o que comer. O outro porque não sabe
como proteger sua fortuna contra a ação pirata do capital especulativo.
In: “A Igreja que eu Amo” Pe. Marcos Bach, sj – Ed. própria.
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