sexta-feira, 21 de março de 2014

A HUMANIDADE TEM O DIREITO A UM FUTURO

Antes de tudo é preciso crer que a humanidade tem o direito a um futuro. E que este futuro só merece fé na medida em que vier a ser melhor do que o passado e o presente. Este futuro será fruto de um gigantesco esforço humano. Não são, no entanto, os rios de sangue, suor e lágrimas que caracterizam este esforço. Um dos aspectos originais do cristianismo está em que associa o esforço do homem a um esforço correspondente de Deus. A imagem de Deus que Jesus nos veio revelar não é a de um Deus expectador, distante de um drama que não o afetava. Quem olha para o Cristo pendurado numa cruz sem ideias preconcebidas, só pode chegar a uma conclusão: Deus levou muito mais a sério a sua parte no esforço comum do que a humanidade.
           
O que as Igrejas cristãs estão fazendo não merece nem o nome de esforço. O tempo gasto no esforço de salvar os náufragos de um barco que está afundando não tem o mesmo valor nem pode ser enfrentado com a mesma displicência com que um burocrata despacha a sua papelada.
           
Se a humanidade é realmente tão necessitada de salvação como parece, então o mais sensato é arregaçar as mangas e tirar passageiros e tripulantes de seus barcos à deriva. A nau de Pedro não afunda porque está firmemente encalhada nas margens do Tibre tanto quanto às margens do próprio tempo histórico. História se faz e não se sofre.
           
Ter fome é uma coisa e passar fome é outra, bem diferente. Os acontecimentos historicamente significativos foram realizados por pessoas que tinham fome e muita fome, mas não passavam fome.
           
Um exército composto de esfomeados e subnutridos não ganha batalhas. Alexandre Magno, César e Napoleão sabiam disso. Um bom soldado só será verdadeiramente bom combatente se tiver a mesma fome de vitórias e a mesma sede de glória que seus comandantes. Por ocasião do seu triunfo em Roma, o general contemplado com esta honra suprema, vinha acompanhado da elite de suas legiões vitoriosas.

No mundo religioso o mérito é dos pastores quando as coisas vão bem e quando algo de errado ocorre a culpa é das ovelhas.
           
Num mundo em transformação como o nosso, os piores pecados costumam ser os de omissão. Numa organização religiosa que obriga os fiéis a se reunir lá onde se encontra o seu pastor, não entendeu Jesus, que não tinha residência fixa e ia lá onde o povo costumava reunir-se. Se os templos estão ficando vazios, isto não quer dizer que o povo está perdendo a fé, mas que os pastores não estão onde deveriam estar. São seus escritórios eclesiásticos que estão perdendo freguesia. A quem pode interessar um cristianismo burocratizado, uma fé que faz do sujeito desta fé um instrumento submisso e cego de vontades alheias e de verdades sobre as quais o tempo perdeu o direito de influir?
           
A história é feita de oportunidades bem aproveitadas. A contra-história é feita por pessoas sem consciência de que o tempo cronológico é composto de momentos oportunos como de momentos inoportunos. A primavera é tempo oportuno para semear e plantar. O outono, ao contrário, é tempo de colher o fruto do que foi semeado e plantado.
           
Nos Evangelhos este tempo recebeu o nome de “Kairós”. Quando ao anoitecer contemplamos um por do sol e percebemos que as nuvens se cobrem de vermelho, sabemos que não vai chover durante a noite. O contrário vale para um novo dia: se o sol tingir de vermelho as nuvenzinhas que o vieram receber, isto significa prenúncio de chuva. “Sabeis muito bem como interpretar os sinais do tempo metereológico, mas ignorais por completo a arte de interpretar os sinais do tempo histórico” (Cf. Mt 16,3).
           
A arte de interpretar corretamente os acontecimentos faz parte da virtude da prudência e do carisma profético de uma Comunidade Cristã. O tempo torna-se significativo quando aponta para uma verdade que está querendo revelar-se.

Padre Marcos Bach

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