quinta-feira, 23 de outubro de 2014

O MEDROSO  E O CORAJOSO

O medroso evita o perigo e só pisa em terreno que julga seguro. Sente-se seguro quando percebe que está indo por onde a maioria também costuma passar. Prefere passa por onde os donos do mapa estão passando. Só grandes estradas aparecem em mapas. Veredas e atalhos não têm esta honra. Os lugares mais lindos e poéticos de um país raramente podem ser visitados por quem não se dispõe a fazê-lo a pé, andando por becos e atalhos que só os nativos do lugar conhecem.

Existem por toda a parte espaços enormes que podem ser classificados apropriadamente como marginais, onde é mais fácil ser livre e autêntico. Não é necessária grande coragem para ir morar neles. A única condição exigida é desprendimento e espírito de pobreza.

Só pode ser considerado verdadeiramente pobre aquele que como os demais pobres pouco ou nada tem a perder.

O corajoso se conhece por sua capacidade de enfrentar riscos e de correr perigos. Enquanto o covarde foge do perigo, o corajoso se dispõe a atravessá-lo, indo mais longe na direção a uma fronteira tida como intransponível. Tanto o medo como a coragem crescem na medida em que deles se faz uso.

O risco maior que o corajoso corre é a de confundir coragem com temeridade. Temeridade não é excesso de coragem, mas falta de prudência. Para ser virtuosa a coragem tem que aliar-se à prudência. David enfrentou Golias de tanga e empunhando uma funda. Além de não ligar para os insultos de Golias, evitou aproximar-se da lança de Golias.

O corajoso não é alguém que despreza o perigo ou o adversário. Todo corajoso digno de respeito possui um elevado grau de autoconfiança. Não espera da coragem mais do que ela é capaz de lhe proporcionar. Os resultados mais preciosos ele os espera da sua inteligência e da sua capacidade de integrar conhecimento intelectual num plano concreto da ação.

Para continuar a ser medroso e covarde basta continuar a ser medroso e covarde. Para continuar a sê-lo basta acrescentar mais medo ao já existente. Para readquirir um pouco da coragem perdida é preciso duplicar a dose. Duplica-se a dose quando se alimenta em sua consciência a coragem de ter coragem.

Quem passou anos da sua vida embalando sua consciência em falsas seguranças não deve esperar que sua coragem adormecida e latente desperte de forma espontânea e sem exigir dele esforço algum. Ao contrário do que acontece nos contos de fadas, nenhum príncipe encantado vai aparecer para despertar um covarde adormecido. “Acaba por perder a sua vida todo aquele que não se dispõe a perdê-la” (Lc 9,24).

Para que um centro cresça é preciso que a periferia cresça junto com ele. Houve uma época em que São Paulo se orgulhava de ser a cidade brasileira que mais crescia. Hoje já não há mais paulistano que queira ver a sua cidade maior do que já é.

Audácia é o nome desta coragem de ter coragem. “Audaces fortuna adjuvat”, diziam os romanos. A “fortuna não se alia aos que têm medo da sua coragem”. Estes acabam, via de regra, tendo até medo do seu próprio medo.

O corajoso não se orgulha da sua coragem. Não estufa o peito nem se vangloria de ser melhor que os outros. Sabe muito bem que não há modo mais perigoso de enfrentar a vida do que enfrentar seus desafios com coragem.

Padre Marcos Bach

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