quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

FALTA-NOS A CONSCIÊNCIA DE CIDADÃOS

Será mesmo que a civilização estragou a humanidade como quer Jean Jacques Rousseau? Que civilização é esta que tornou os homens piores e mais insensíveis do que eram antes? A palavra civilização está associada ao conceito de cidadania. Cidadão,cives, em latim, serve para identificar pessoas que vivem em cidade. O seu oposto é o homem que vive no campo. Da palavra campo vem o termo camponês, que pelo fato de viver no campo, é considerado rústico e menos desenvolvido que os “civilizados” moradores de uma cidade. O aparecimento de grandes centros urbanos é recente. 

Mesmo no auge da sua prosperidade, Roma não contava com mais do que um milhão de moradores. Todo o Império Romano não tinha mais que cinquenta milhões de habitantes. O número de cidadãos romanos não ultrapassava, no tempo de Cristo, a casa dos duzentos mil. A urbanização do convívio social é, portanto, fenômeno recente. Só um sociólogo mal informado não percebe que ainda não sabemos como viver juntos.

De acordo com a opinião de Jean Jacques Rousseau, o que levou o homem civilizado a se corromper, foi a sua perda de contato com a natureza. Deixou de cultivar o seu lado instintivo movido pela presunção de que podia despedir-se da sua animalidade conferindo à razão um papel que os demais membros da biosfera costumam confiar ao instinto. Comparado com a sabedoria do instinto, as luzes da razão humana mais se parecem com lampejos de fogo fátuo do que com luminárias dignas de confiança.

Na época de Rousseau ainda existiam florestas virgens, intatas e povoadas de espécies de animais hoje extintas. 

O que restou da natureza daqueles tempos? É simplismo puro imaginar que o retorno à natureza ainda é possível. Quem mora em cidade contrai vícios e hábitos que tornam difícil uma readaptação à vida campestre. De mais a mais, o problema não é a cidade em si. Não se pode esquecer que o processo de urbanização faz parte do próprio processo de desenvolvimento integral da humanidade. 

A desumanização da cidade não acontece porque muita gente foi morar no mesmo lugar. Em outras palavras: o responsável pelos problemas de segurança e de transporte que afligem os moradores da maioria de nossas cidades de porte médio ou grande não é o fato de um número muito grande de pessoas morarem juntas, mas o fato social responsável por esta situação é a sua falta de preparo psicológico e ético para o convívio em ambiente urbano.

O homem do campo é cioso da sua privaticidade. Não quer ninguém por perto. Lugar de estranho é a estrada. A maioria dos moradores de nossas cidades vieram do campo e sua cabeça ainda funciona como a dos seus avós. As nossas cidades são híbridas, mestiços culturais: seus moradores vivem com os pés na cidade e com a cabeça na roça.

A palavra urbanização é empregada como sinônimo de boa educação, bons modos. Ao passo que o termo rusticidade é usado para classificar um tipo de comportamento em tudo oposto a tudo o que se costuma entender por urbanidade.

Os últimos a se converterem ao cristianismo foram os “pagani”, os que moravam fora das cidades. É mais fácil fundar uma Comunidade Cristã com pessoas que já aprenderam a viver em harmonia umas com as outras. Foi em cidades como Jerusalém, Roma e Antioquia que surgiram as primeiras Comunidades Cristãs de que temos notícia.

A mensagem proposta por Cristo sempre se deu melhor em ambiente urbano do que no campo. A razão é simples: na cidade é mais fácil reunir pessoas do que na roça. As pessoas do campo costumam ser mais individualistas e pouco propensas a compartilhar sua privacidade com outros. Por tudo isso é mais fácil cristianizar uma cidade.

O que não existe neste país é uma pastoral da cidade. Pastoral de terra, isso temos. O clero que atua nas cidades procede quase que exclusivamente do campo. Temos um ministério da cidade, mas é administrado por um ministro que não sabe sequer o que fazer com o dinheiro de que pode dispor. Quem pode, aproveita o fim de semana e as férias para fugir da cidade em que vive. 

Agimos como se a cidade não fizesse parte do que entendemos por natureza. O oposto da natureza é o artificial. Artificial é tudo o que deve sua origem à mão do homem. Mas o fato de viverem num mundo todo ele feito pelo homem, não impede a maioria dos moradores de uma cidade de preferir o natural ao artificial.

Rousseau não foi o último a prestigiar o natural em detrimento do artificial. A Moral católica continua condenando como contrários à moral todos os métodos contraceptivos artificiais admitindo como natural somente o da abstinência.

A urbanização da sociedade humana é um fenômeno recente, porém irreversível. Presta mau serviço à humanidade quem sonha com uma espécie de retorno ao campo como queria o truculento e tirânico Pol Pot do Camboja.

A cidade veio para ficar. É preciso conformar-se com a perspectiva de passar o melhor da sua vida num ambiente social todo ele feito pela mão do homem. 

Foi com a intenção de participar mais de perto do processo evolutivo da humanidade que Deus, em Pessoa, tomou a decisão de assumir a natureza humana. Na Pessoa de Jesus Deus se tornou Homem, conferindo, deste modo, à natureza humana um novo status. Incluindo a divinização da natureza do Homem como termo final de todo o processo evolutivo, Deus em Pessoa se tornou o Alter Ego da humanidade toda.
Padre Marcos Bach

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